O Brasil é um país que opera num sistema, onde a Constituição garante a cada ente federativo a autonomia operacional, respectivamente: união, estados e DF e municípios. Dessa forma, quando tal autonomia atinge a ANVISA e as Vigilâncias Sanitárias (VISA) locais, a coisa torna-se não só confusa, mas atinge o nível da perversão.
Explico: as empresas têm que submeter a critérios díspares e muitas vezes contraditórios. Nem sempre o requisito exigido pela ANVISA é o mesmo demandado localmente e vice-versa. Se o tema for matriz e filiais e municípios e estados diferentes, a coisa toma um vulto ainda maior e pior. Os requisitos mudam ao bel prazer das legislações locais e convênios entre as partes, por exemplo estados e municípios, nem sempre claros e acessíveis ao Setor Regulado.
Dessa forma, muitas questões que seriam de solução relativamente simples, tomam meses, senão anos para que possam ser solucionadas, levando, em muitas ocasiões, à judicialização, tão criticada, mas infelizmente tão necessária no Brasil.
Daí vem a perversão, o custo desnecessário e a consequente perda de competitividade.
Falar do problema é a parte fácil. Difícil é diagnosticá-lo adequadamente e, mais complicado ainda, é propor uma solução.
O diagnóstico é difícil e não quero parecer simplista, mas vou elencar alguns dos problemas bastante conhecidos do Setor Regulado aos quais parece que o poder público é absolutamente indiferente: iniciamos com a falta de conhecimento que muitas vezes as equipes das VISAs locais enfrentam, não porque não gostariam de conhecer toda a legislação, mas porque são equipes pequenas, com acúmulo de trabalho e um afastamento involuntário daquela que deveria ser a fonte de conhecimento para todos da área dos assuntos regulatórios: a ANVISA.
Como segundo ponto, destaco a pouca acessibilidade e a comunicação difícil entre a ANVISA e as VISAs estaduais e municipais. Essa é uma queixa constante, quando conseguimos acesso à essas equipes, ou seja, como se sentem colocados de lado pela ANVISA, que deveria ser o grande centro de onde deveria emanar o conhecimento regulatório.
A comunicação é difícil, confusa e as respostas da Agência, muitas vezes dizem tudo e não falam nada. Também assim acontece com o Setor Regulado que muitas vezes recebe a resposta da ANVISA ou das VISAs com o tema que gerou a própria dúvida.
Explico: a empresa manda uma dúvida sobre determinado artigo de uma Resolução e recebe como resposta, 15 dias depois, que deveria ler aquele mesmo artigo daquela mesma resolução.
O terceiro ponto de diagnóstico é que a legislação brasileira nesse tema é esparsa, muito pouco clara e desatualizada.
Vamos à possível solução, dividida em capítulos, porém, antes, vamos fazer um breve comentário, qual seja: a atribuição da ANVISA e das VISAs locais abrange uma enorme parte das atividades econômicas que compõem o Produto Interno Bruto. Portanto, de início, caberia ao Poder Executivo e ao Legislativo, dar a devida importância ao tema. O famoso “custo Brasil” começa na judicialização que às vezes, tem que se dar mesmo antes da empresa iniciar suas atividades no Setor Regulado.
A própria ANVISA, senhora absoluta do conhecimento regulatório no país, deveria elaborar, em conjunto com o setor Regulado, um Código Sanitário Nacional para, finalmente, ser usado como instrumento de orientação num sentido único por todas as VISAs e pela própria Agência.
Em segundo lugar, é inadmissível que em tempos de Internet, a Agência ainda não tenha uma área de treinamentos à distância (EAD – Ensino à Distância) para o setor Regulador (VISAs e fiscais) como para o Setor Regulado. EAD esse, que deveria ser atualizado trimestralmente, no mínimo. Essa deveria ser uma obrigação legal, prevista na revisão que o Poder Legislativo deveria fazer das leis e decretos em vigor, consolidando-os num ato único.
Em terceiro, a documentação como formulários, relação de documentos aceitos com exemplos efetivos, roteiros de inspeções, modelos de relatórios, etc., deveria ser uniformizada e disponibilizada tanto para as VISAs como para o Setor Regulado, evitando-se que em cada município ou estado as empresas tenham que investir meses na tentativa de obter uma informação simples.
Há municípios e estado que simplesmente se negam a disponibilizar um formulário se não for presencialmente, no balcão (é de se imaginar o caos durante esse período de pandemia). Isso só faz aumentar a ineficiência e a baixa competitividade do Brasil no comércio exterior, na atração de investimentos e na oferta de empregos.
Enfim, poderíamos aprofundar muito mais o diagnóstico e a propositura de soluções. Este breve artigo só mostra que existem caminhos possíveis e que já passou, e muito, da hora dos poderes constituídos darem a devida atenção ao tema, sob o risco de permanecermos sempre no pelotão da retaguarda da competitividade, atração de investimentos e, enfim, da oferta de melhores e mais acessíveis tecnologias médicas ao Povo Brasileiro.