Digite o termo inovação no Google e você receberá de volta dezenas de definições diferentes...Para facilitar sua vida, faça o seguinte: jogue fora todas aquelas que não fizerem menção a palavra Valor!
Sim. Inovação deve produzir Valor.
E a dificuldade em entender melhor a inovação nos dias de hoje está no fato de que o tal Valor vem mudando de lugar ao longo dos últimos anos.
Nos anos 90, por exemplo, a lista de empresas mais inovadoras do mundo era liderada por quem injetava Valor na linha de produção. Empresas de bens de consumo fabricavam produtos valiosos. Gastavam muito tempo (e dinheiro) em P&D.
Daí a vontade de todo estudante universitário, como eu à época, de trabalhar em lugares como 3M, Procter, Nestlé etc.
Pergunte hoje a um estudante universitário quais são as empresas mais inovadoras em que ele gostaria de trabalhar e veja como isso mudou...
As empresas que ele vai lembrar dificilmente fazem produtos numa fábrica.
Da mesma forma, elas não prestam serviços, como outras tantas empresas que lideraram aqueles mesmos rankings.
As empresas que ele irá lembrar são empresas que injetam Valor numa nova área dos negócios, inexistente há 20 anos, chamada Experiência do Usuário (a tão falada, e por vezes mal compreendida, UX).
Gympass, iFood, Rappi, Uber, Airbnb...Essas empresas não produzem sequer um parafuso por ano e não recebem sequer um cliente em seus pontos de atendimento (essa tarefa fica para os motoristas autônomos, restaurantes, academias, donos de imóveis etc).
O que essas empresas produzem são experiências para seus usuários. São fábricas de UX.
É essa a grande marca de muitas startups de sucesso e que faz com que elas sejam difíceis de ser copiadas por grandes empresas.
Porque criar e - principalmente - vender UX não é algo óbvio.
A começar pelos modelos de negócios, que são substancialmente diferentes dos modelos tradicionais - do business as usual - e que normalmente não se pagam num primeiro momento (free, saas, fremium etc). Via de regra, aliás, eles demandam uma injeção de capital de risco oferecido por fundos de VC.
Daí que podemos falar que, no século XXI, para uma empresa ser considerada inovadora é necessário que ela gere Valor para a experiência do usuário, o que é materialmente diferente de prestar um bom serviço. Não é óbvio.
Para que esse Valor se concretize na prática essas empresas trabalham de uma forma muito específica, com agilidade e empatia para gerar essas UX. Enquanto produzem, geram e consomem dados em doses cavalares para dar objetividade e precisão para uma oferta, por vezes, tão intangível.
Por isso tantas empresas agora tentam seguir essa mesma regra de ouro para poder competir num mercado baseado em usuários diferentes, com jornadas diferentes e que darão o tom da inovação nas próximas décadas. Esse é o pano de fundo da transformação digital.
É por essa série de motivos que nós, na Saúde, não devemos acreditar que alguns avanços recentes, como a adoção da telemedicina, significam por si só, uma transformação digital bem sucedida, como alguns preferem acreditar.
Trata-se apenas de um primeiro passo. O caminho a nossa frente continua muito longo. Modelos mentais não mudam de uma hora para a outra. Tecnologia se adquire com dinheiro. A forma de pensar o negócio e o jeito de trabalhar não são modificados com a simples publicação de uma RFP.
Temos que tirar proveito, sim, do momento atual. Mas ele deve nos encorajar para o enorme desafio de transformação que continua aberto à nossa frente.
* Este texto sofreu alterações em 15/06/2020 a pedido do autor.