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Realidade aumentada na saúde: potenciais aplicações e desafios

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Uso da tecnologia ainda é restrito no Brasil, mas profissionais se mostram otimistas com as possibilidades emergentes no setor.

Ao longo da história, novas tecnologias ajudaram a revolucionar e avançar no campo da medicina. Hoje, duas delas vêm ganhando destaque na área da saúde: a realidade aumentada e a realidade virtual. Desde a última década têm se tornado cada vez mais populares, com o desenvolvimento de dispositivos como o Oculus Rift, o Meta Quest e o recém-lançado Apple Vision Pro.  

De acordo com as previsões da GlobalData, o mercado de realidade aumentada valerá US$ 100 bilhões até 2030, ante US$ 22 bilhões em 2022. No entanto, segundo o relatório, a adoção em larga escala de dispositivos de realidade aumentada será limitada no curto prazo devido ao seu alto custo e à relativa imaturidade da tecnologia. 

Porém, à medida que essas tecnologias se tornam mais comuns, elas convidam os profissionais da área a integrá-las às práticas clínicas e fluxos de trabalho, mudando completamente a maneira como os serviços de saúde poderão ser ofertados.  

Os médicos devem abordar essas tecnologias com uma perspectiva tripla, avaliando como podem enfrentar seus desafios, melhorar o atendimento ao paciente e impulsionar a inovação no campo médico.  

Tanto a realidade aumentada quanto a realidade virtual podem simplificar fluxos de trabalho, melhorar a precisão do diagnóstico e facilitar a colaboração remota. Para os pacientes, essas tecnologias oferecem educação aprimorada e planos de tratamento personalizados, adaptados às necessidades e preferências exclusivas de cada indivíduo. 

Raquel Acciarito Motta, sócia proprietária da Prisma Consultoria em Saúde e da ACCI MED Health Care, explica que atualmente, no Brasil, tem sido observado o uso da chamada realidade mista, ou seja, tecnologia que reúne a realidade aumentada com a realidade virtual. 

“No Brasil, a realidade aumentada, na área da saúde, ainda está sendo testada em suas diversas possibilidades. Mas inegavelmente somos um país no qual o desenvolvimento e o crescimento do uso de tecnologias imersivas têm sido acelerado”, conta ela. 

Raquel cita como exemplo desse cenário uma pesquisa realizada pela Ipsos, em 2022, que avaliou a percepção de cidadãos do Brasil e de outros 28 países sobre temas como metaverso e realidade estendida (que inclui realidade aumentada e realidade virtual). Segundo o estudo, os brasileiros enxergam os avanços com bons olhos. Para 60%, a possibilidade de se envolver com realidade virtual no cotidiano é algo positivo. Considerando as respostas de todos os países, a média global sobre esse tema ficou em 50%.  

Potenciais usos da realidade aumentada na saúde: quais são eles? 

Raquel comenta sobre as diversas possibilidades que estão sendo vislumbradas na área da saúde, como a visualização em 3D de imagens médicas e a possibilidade de uso da realidade aumentada para sobrepor imagens em tempo real sobre o corpo do paciente durante um procedimento cirúrgico, o que permite que o médico visualize estruturas internas diretamente no seu campo de visão, o que garante mais precisão aos movimentos.  

“Na interpretação de exames de imagem, a realidade aumentada pode ser aplicada pra sobrepor informações adicionais diretamente na imagem gerada durante a realização do exame. Com isso, alguns detalhes anatômicos podem evidenciar patologias que seriam mais difíceis de serem observadas a olho nu, deixando esses detalhes mais claros para pacientes e médicos”, diz Raquel.  

Outro uso da realidade aumentada na saúde é no treinamento de profissionais. Com a tecnologia, os futuros médicos podem visualizar estruturas mais complexas do corpo em modelos 3D, obtendo melhor detalhamento da área estudada.    

“Quando um profissional de saúde é treinado em um ambiente imersivo com realidade aumentada, quando ele migra para o ambiente real, junto ao paciente, estará mais preparado para realizar o procedimento correto e mais seguro na tomada de decisão. Universidades têm criado mundos imersivos para os aprendizes que simulam, por exemplo, ambientes de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) e pronto-socorro.” 

Outro uso destacado por Raquel tem sido visto na reabilitação e na educação do paciente, onde são criados ambientes interativos para que ele entenda o tratamento que está sendo proposto e assim se engaje na sua jornada. “A realidade aumentada tem sido usada em terapias de movimento, onde o paciente consegue visualizar a maneira correta de fazer os movimentos e entender como o tratamento ajudará na sua reabilitação.”  

Ela comenta ainda que as novas tecnologias têm o papel de contribuir para tornar o paciente protagonista do seu tratamento. “Por meio de dispositivos que ele tem em mãos, poderá receber informações sobre educação em saúde. Além disso, a melhor compreensão espacial e visual dos elementos fica mais clara tanto para pacientes quanto para médicos, melhorando a precisão diagnóstica e o planejamento do tratamento.” 

Na opinião da especialista, o uso de realidade aumentada, ou mista, contribui para uma maior precisão em um procedimento e reduz erros de diagnóstico. “O treinamento prévio em um ambiente virtual contribui para formar um profissional mais preparado e confiante, o que reduz a chance de complicações e, consequentemente, de custos para o sistema de saúde.”  

Natacha Chaves, coordenadora de Produto e Inteligência da Pixeon, diz que a realidade aumentada, unida à inteligência artificial, traz uma percepção do resultado final de um procedimento muito antes dele ser efetivamente concluído.  

“Diante disso, acredito que vem aí uma nova onda de revolução na medicina, que é chegar muito próximo da perfeição, principalmente nos casos de pacientes que tiveram membros amputados, sofreram acidentes críticos, precisam de uma reconstrução e de uma restituição de tecido. Vejo isso como uma forte tendência do mercado, unindo as duas tecnologias, a realidade aumentada e a inteligência artificial.” 

Uma das preocupações em relação ao uso da tecnologia muitas vezes está na integração com outros sistemas já usados pela empresa. Fabio Flores, diretor de Enterprise Solutions da GE HealthCare para América Latina, explica que o processo de integração da realidade aumentada com outros sistemas tecnológicos pode variar dependendo do sistema em questão e das necessidades específicas da empresa.  

“Em geral, a integração começa com uma avaliação dos sistemas existentes e da infraestrutura de TI da empresa. Isso ajuda a identificar possíveis pontos de integração e a determinar quais sistemas precisam ser atualizados ou modificados para suportar a realidade aumentada. Em seguida, é necessário escolher uma plataforma que seja compatível com os sistemas existentes e que atenda às necessidades da empresa”, explica ele.   

Depois de escolhida essa plataforma, é necessário integrá-la aos sistemas existentes. Isso pode envolver o desenvolvimento de APIs personalizadas (Application Programming Interface) ou a configuração de soluções de middleware para permitir a comunicação entre os sistemas.  

Uso da realidade aumentada em uma instituição de saúde   

No Hospital Santa Paula, a realidade aumentada vem sendo usada no planejamento cirúrgico pré-operatório e na sala cirúrgica durante o procedimento, principalmente em cirurgias de ombro. 

“O cirurgião dispõe de um holograma pairando no ar, que é utilizado para guiá-lo durante o procedimento. Utilizando óculos ‘especiais’, comandos vocais e gestos, movendo as mãos pelo ambiente e manipulando o holograma da anatomia óssea do paciente - proveniente da tomografia do ombro -, surge diante dos olhos do cirurgião um modelo pré-programado da anatomia do paciente. A realidade aumentada nos ajuda a analisar os exames de imagem, no caso a tomografia, para guiar o cirurgião durante a realização do procedimento”, explica Nicola Archetti, ortopedista do hospital.  

Ele diz que, combinando a tecnologia de hologramas gerados por um software, onde é possível programar e simular o ato operatório, as imagens tridimensionais criadas podem guiar o cirurgião para um melhor posicionamento dos componentes protéticos que serão implantados na articulação do ombro.   

“A geração de hologramas é uma revolução no campo tecnológico, com a realidade mista se transformando em uma nova ferramenta para as cirurgias ortopédicas. É uma ferramenta que nos permite replicar a cirurgia de forma bastante precisa. É possível antever problemas e programar uma série de correções necessárias durante o procedimento cirúrgico, reduzindo assim os riscos de complicações e trazendo melhores resultados.” 

Desafios para que a realidade aumentada se solidifique no país 

Raquel cita como um dos principais desafios a falta de mão de obra capacitada para lidar com essa tecnologia. “Temos cursos sendo oferecidos no Brasil, mas quando essas pessoas se formam, devido à falta de profissionais no mercado, rapidamente são abarcadas por outros países que oferecem melhores oportunidades. Ou seja, temos um desafio duplo: de formar e reter esses especialistas.” 

O custo é outro desafio. “Além do alto valor para aquisição de hardware e software, o valor para armazenamento do conteúdo digital em nuvem é expressivo, devido ao volume de dados, o que pode tornar inviável a adoção da realidade aumentada para muitas instituições.” 

Outra solução, diz Flores, é o armazenamento em rede, que permite que as empresas armazenem grandes quantidades de dados em um único ambiente, tornando mais fácil o acesso e a gestão dessas informações.  

Segundo Raquel, um ponto que precisa ser lembrado nessa discussão é a segurança dos dados. “Temos que garantir que a realidade aumentada funcione de maneira segura dentro dos ambientes. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) precisa criar normas especificas para o uso da realidade aumentada e da realidade virtual na prática médica.” 

Por fim, Raquel cita ainda a resistência por parte de alguns profissionais com a introdução das novas tecnologias. Para vencê-la, acredita a especialista, é preciso promover cultura organização que valorize a inovação e a melhoria contínua. 

O que podemos esperar para o futuro 

“As perspectivas futuras de realidade aumentada para a área da saúde no Brasil e no mundo são promissoras. A tecnologia tem o potencial de revolucionar a forma como os profissionais de saúde trabalham, melhorando a precisão do diagnóstico, aumentando a eficiência dos tratamentos e melhorando a experiência do paciente. Inclusive o ensino e aprendizagem médica, assistencial e mesmo dos profissionais técnicos, como engenheiros que atuam na saúde, podem ser muito beneficiados”, destaca Flores.   

No Brasil, a realidade aumentada já está sendo usada em algumas instituições de saúde, mas ainda há muito espaço para crescimento e inovação.