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Santa Casa e a Gestão de Contratos

As auditorias demonstram como a fragilidade na gestão dos contratos da Santa Casa põe em risco a instituição, mas somente criticar ou apontar irregularidades não resolve o problema - é necessário ajudar a Santa Casa

Vou me permitir mais um post sobre a Santa Casa de São Paulo, agora que

a situação vai ficando cada vez mais clara e dramática.

Acho que todos devem ter visto a declaração de que a partir da

declaração de um funcionário sobre o preço exorbitante que a Santa Casa pagava

para um fornecedor de medicamento, uma auditoria identificou esquema de fraude

em contratos.

A agonia de uma instituição tão importante para o sistema de saúde, que

estamos há alguns meses alertando ser a ‘ponta do iceberg’, vai tomando o rumo

de casos como o do Hospital Humberto Primo, Maternidade São Paulo e outras,

infelizmente.

Auditoria, ‘endurecimento’ nos repasses e investigação é algo mais do

que necessário. Mas é importante insistir que estes remédios vão ‘curar o

sintoma’, mas se nada mais for feito, a ‘doença’ vai prevalecer.

A Santa Casa não está agonizando por incapacidade técnica, falta de

empenho de funcionários, desmotivação do corpo assistencial ... nada disso –

está agonizando por falta de gestão adequada.

Esta afirmação pode ser mal interpretada como sendo um ataque aos

administradores, ao corpo gerencial, mas quem está no segmento sabe que não é

disso que estamos falando.

Conforme já comentamos em outros posts, a Santa Casa não se reposicionou

no mercado. Continua sendo uma instituição que existe para tratar de doentes de

forma benemerente, e mesmo sendo uma instituição privada, vive essencialmente

de verbas públicas – uma gestão pública em uma instituição privada – esta conta

não fecha !

O que temos insistido em pedir para as instâncias de governo envolvidas

é que além de dar dinheiro e auditar, é necessário ajudar a Santa Casa a se

auto sustentar, como fazem os grandes hospitais públicos que administram sua

porta 2 de forma eficiente, tornando esta pequena participação na saúde

suplementar, gerida de forma adequada, a garantia da sua existência com menor

influência do setor público na sua gestão.

O governo não deve somente ‘dar o peixe’, mas deve ‘ensinar a pescar’,

porque a Santa Casa não vai aprender a fazer isso sozinha. Se a Santa Casa não

admite que necessita de apoio para se reposicionar no mercado e melhorar sua

gestão, e se o governo não ajudar nisso, vamos continuar assistindo:

  • As 3 instâncias de governo politicamente se aparelhando para justificarque dão mais dinheiro do que ela necessita (e com razão);
  • A dívida da Santa Casa crescendo, e geometricamente;
  • Greves de funcionários e falta de insumos por falta de pagamento aosfornecedores.

Para começar é necessário quebrar o esquema atual de atendimento em

porta 2 da Santa Casa, que não é igual ao adotado pelos hospitais públicos de

excelência e se mostra, ao invés de uma ferramenta de apoio do complexo, um

problema de gestão que não se consegue equacionar. Não é problema complexo no

âmbito técnico ou administrativo – na verdade é um grande problema político que

a Santa Casa sozinha jamais conseguirá resolver. Por isso a necessidade do

governo, nas 3 instâncias, ajudar !

É necessário tornar a Santa Casa sustentável tanto no que se refere à

sua atuação no SUS, quanto reformar sua forma de atuação na Saúde Suplementar.

Apostaria meu ‘último dólar’ que se a auditoria mudasse seu rumo de

investigação, descobriria que um eventual rombo por ‘perda de receita’ é

infinitamente maior do que o rombo por fraude em contratos com fornecedores. A

capacidade que o Complexo Santa Casa tem para gerar receita é muito grande, e

se a gestão comercial for bem feita o impacto da má gestão dos fornecedores

seria imensamente menor do que é – do que estamos vendo.

E é necessário implantar um modelo de gestão de contratos eficiente.

Comentei em posts recentes o quanto a gestão de contratos tem evoluído, mesmo

em fundações. E quando falamos em gestão de contratos, nunca falamos da

tradicional, onde uma controladoria fica apenas verificando se a vigência do

contrato expirou, ou apenas se o fornecedor apresentou a CND da Previdência

Social para poder receber seu pagamento.

Falamos da gestão de contratos referenciada em CLM (americano) ou GCVC,

ou seja, do sucesso do negócio através da gestão eficiente dos contratos – com

um modelo eficiente para gestão do ciclo de vida dos contratos não é necessário

contratar uma auditoria externa para saber que está pagando valor exorbitante

por um medicamento – os processos de gestão naturalmente dão transparência a isso.

Só como comparação, sem citar nomes, estamos vendo uma grande empresa

governamental fora do segmento da saúde sofrendo com escândalos em contratos

porque desenvolveu uma fórmula própria para fazer isso – não adotou um modelo. Outras

empresas governamentais que adotaram um modelo não estão na mesma situação.

Duas delas em que participamos da implantação do CLM-GCVC teriam tudo para

estar em pior situação que ela ... e não estão ... e a chance de estarem é

mínima !

Os governos gastariam muito menos ajudando a Santa Casa a se estruturar

para a gestão dos contratos de agora em diante, do que tudo que poderia receber

de reembolso investigando fraudes. Identificar fraudadores é importante, mas

aumentar a segurança para que as fraudes sejam minimizadas a partir de agora é

muito mais. ‘Estancar o sangramento’ é muito mais importante do que repor o que

foi perdido, e a Santa Casa já deu mostras de que não sabe, ou não pode, fazer

isso sozinha.

Vou continuar torcendo para que esta fase de auditoria, acusações

mútuas, embates políticos entre as instâncias de governo e os inquéritos

investigativos não excluam um esforço paralelo para melhorar a gestão da Santa

Casa.

Vamos curar a doença sem matar o doente ?