É comum confundir o que é importante do que é fundamental. Quando dizemos que os contratos são o que de mais importante existe na empresa o entendimento gera discussão porque logo alguém diz que são os funcionários, e alguém retruca: mas o início do relacionamento do hospital com o funcionário é um contrato de trabalho.
Esta discussão não tem nexo, porque importante (veja no dicionário) é o que se dá apreço, o que mais interessa, enquanto fundamental (também no dicionário) é o que dá fundamento, ou seja, que serve como base.
O prédio é importante, mas o alicerce é fundamental o carro é importante, mas o pneu é fundamental, e assim por diante.
Portanto contratos podem ser a coisa mais importante da empresa sim, enquanto o funcionário é o fundamental !
Em hospitais este fundamento é mais importante do que na maioria das demais empresas. Na distribuição dos custos hospitalares (dados históricos do PROAHSA*, por exemplo) pessoal representa 49% do total, enquanto materiais e medicamentos 34% e outras despesas 17%.
Mesmo se não considerarmos que a atividade hospitalar está mais para marcenaria do que para carpintaria, ou seja, mesmo se você discordar que a assistência ao paciente hospitalar é mais produção personalizada do que produção em série, não vai conseguir discordar que se existe algo que se deva investir para melhorar a competitividade hospitalar, este algo são as pessoas, porque representam a maior parcela de custo.
O dirigente hospitalar despreparado (ainda maioria no Brasil) pensa que investir em treinamento de pessoal aumenta ainda mais a despesa, ou seja, se já gasta 49% com pessoal, por que gastar ainda em treinamento para aumentar ainda mais esta relação ?
Infelizmente este é o perfil dos dirigentes hospitalares, tanto na área pública quanto na saúde suplementar o pensamento exatamente inverso do que deveria ser.
Citando alguns exemplos nas áreas em que mais atuamos, vou começar com a área de faturamento e auditoria de contas hospitalares. Todos sabem que o sistema de remuneração da saúde no Brasil é insano, ineficiente e propositalmente complicado. Há anos debatemos que no sistema SUS, embora com regras mais claras que na saúde suplementar, as pessoas que atuam em faturamento não conseguem visualizar tudo o que o sistema permite na realização da receita, e sub faturam contas neste blog comentamos diversos casos em que atuando de forma diferente na formação das contas, mesmo sem reajuste na tabela SUS, foi possível elevar o ticket médio das contas. Também há anos debatemos que a ANS não faz nada para melhorar o relacionamento comercial entre hospitais e operadoras, se restringindo a regulamentar um sistema de remuneração que tem como maior especialização e contingente a figura do auditor de contas também neste blog citamos casos em que o aporte de conhecimento nas áreas comercial e de faturamento quase duplicaram o faturamento hospitalar.
Saindo do âmbito da receita e indo para custos, comentamos diversas vezes a dificuldade que os profissionais assistenciais têm em adaptar sua conduta às necessidades administrativas, e vice-versa no ambiente hospitalar. Nos cursos de Gestão de Contratos, Gestão de Projetos e Gestão de Processos quando mesclamos, por exemplo, enfermagem com administradores na mesma turma, podemos ver o brilho nos olhos dos que finalmente entendem a dimensão da necessidade de integrar processos assistenciais com administrativos (e vice-versa), e prover os processos de qualidade na verdade passam a compreender o conceito de qualidade do processo, que é muito diferente do conceito de qualidade para o cliente do processo, ou para o cliente do hospital, que olha o resultado e não o processo, o projeto, o contrato, etc.
O erro do dirigente hospitalar é não conseguir entender que quanto maior a capacitação das pessoas, menor a despesa com pessoal, especialmente a capacitação dos que assumem a posição de gestor (conceito, aliás, que infelizmente poucas pessoas realmente entendem, confundindo as figuras de líder, gestor, comandante, etc.).
Quanto maior a capacitação, mais qualidade nos processos, e consequentemente:
- Menor a despesa com pessoal, porque os processosnecessitam de menor volume de funcionários;
- Melhor o resultado na percepção do cliente, econsequentemente melhor a posição do hospital no cenário em que compete.
Resumindo: capacitação é elemento de competitividade, seja na redução de custos, quanto na realização da receita.
Por isso reclamamos que os governos (em todos os âmbitos, de todos os partidos) estão no caminho errado para melhorar a saúde no Brasil porque fundamentalmente:
- só citam expansão do sistema, da rede assistencial;
- só falam em aumentar o que não funciona bem;
- não têm como prioridade a eficiência ... não dizemo quanto vão investir em capacitação nenhum deles se compromete em capacitarninguém porque dar emprego gera mais voto do que capacitar alguém que já estálá para fazer.
Por isso dizemos que o dirigente do hospital privado erra quando adota como prática captar pessoas capacitadas no mercado:
- A capacitação necessária para fazer o hospital funcionarexiste, mas para dotar o hospital de eficiência e eficácia não é necessárioinvestir para isso;
- As regras de normatização e regulação mudam o tempotodo se não existe investimento em capacitação dos funcionários, em poucotempo eles ficam desatualizados e vão continuar fazendo da mesma forma comosempre fizeram, se tornando cada vez mais ineficientes.
Esta semana é especial para tratar deste assunto:
- É a semana do dia mais esquecido noBrasil o dia do professor. O ensino está tão mal conduzido no Brasil quenossa melhor universidade já não consta na lista das 150 melhores do mundo, e asemana do professor ao invés de comemorar o aprendizado, ficou famosa comosendo a semana do saco cheio;
- É a semana do dia do médico (da fisio também), que éuma profissão que além da vocação exige do profissional o contínuodesenvolvimento técnico. A mesma exigência, aliás, a que se submete aenfermagem, a fisioterapia, a nutrição, a farmácia e todas outras assistenciais.Mas no Brasil estas profissões acabaram sendo 'infectadas' pela ausência decapacitação complementar, ou seja, infelizmente é prática o contínuodesenvolvimento do aspecto técnico, mas não o aperfeiçoamento administrativo,estratégico, estatístico, financeiro, tecnológico, e de outras áreas deconhecimento que poderiam dotar a área da saúde da eficiência, eficácia eefetividade que todos gostariam que tivessem ... mas não tem.