Faço parte de um grupo de docentes da área da saúde que há anos quando chega nesta época do ano diz: poupe sua frustação com o que não aconteceu de bom este ano na saúde, porque o ano que vem vai piorar.
E mesmo este grupo não sendo formado de visionários, astrólogos, magos ou coisa parecida: a cada ano a situação piora, porque não é necessário ter bola de cristal, basta estar no segmento para saber que nenhuma ação defendida por quem é do ramo é tomada, em todas as esferas governamentais.
2014 foi um ano bem diferente de 2013: manifestações, copa do mundo no Brasil, e eleições majoritárias.
Tivemos exposição máxima da evidência e dos sinais de que os modelos assistenciais e de gestão da saúde pública e da saúde suplementar são ineficientes, ineficazes, caros e de péssima qualidade. Foi raro não ver pelo menos uma vez por semana em todos os noticiários algum absurdo relacionado à saúde pública ou à saúde suplementar. A saúde foi alvo de séries de reportagens denunciando o descaso, a ineficiência, a incompetência e tudo de ruim que se pode estereotipar sobre algum assunto.
Tivemos a oportunidade de discutir e definir novos rumos durante o processo eleitoral. Ouvimos novamente as mesmas propostas que não deram certo no passado, e promessas de todos os candidatos em todos os âmbitos governamentais de que saúde seria prioridade.
Mas em menos de 1 mês após as eleições só se fala sobre quem será o novo ministro da economia, meta de inflação, distribuição de ministérios e secretarias de estado para compor a base parlamentar ... nada, absolutamente nada, sobre saúde.
Dá a impressão de que entre outubro e hoje a doença acabou no Brasil, ou que tudo que se falou era apenas argumento da oposição para demonizar o governo. Um mero exagero eleitoreiro.
Canso de ler meus professores dizendo o que deve ser feito para melhorar a assistência. Basta ler os textos das últimas chamadas aqui do Saúde Web para ver que meus professores têm a receita para curar a doença e basta ver o que as instâncias de governo estão planejando para seu mandato para concluir que eles entendem a receita, mas não vão fazer porque cura a doença mas não dá voto.
Dá para imaginar que em 2014, ano em que é difícil se deparar com alguém que não tenha um smartphone, ou seja, que é raro imaginar alguém não esteja conectado na Internet para alguma coisa ... e ainda não temos um prontuário único e eletrônico dos pacientes ?
Praticamente 100 % da população recebe um SMS a cada movimentação na sua conta bancária, mas ninguém recebe um SMS avisando que seu exame de colesterol é crítico e requer atenção ! Nenhuma ação proativa é tomada na saúde pública ou na saúde suplementar quando se evidencia através de exames e registros de diagnóstico que um paciente requer atenção preventiva para evitar o infarto, o AVC ...
É possível aceitar que mesmo pagando a mais cara saúde suplementar do mundo espalhamos nossos registros assistenciais por dezenas de instituições privadas em meio eletrônico, e no momento que mais necessitamos que estas informações estejam nas mãos do nosso médico não é possível consolidar ?
Será que ainda tem gente que discorda que este modelo atual de assistência fragmentada encarece o atendimento e mata o paciente ?
Se todos entendem, por que nada é feito para mudar o cenário ? Por que se prioriza só a taxa selic ... não tem espaço para priorizar também o índice de morbidade, a taxa de mortalidade, o índice de infecção ?
Vamos nos perguntar: o que está na pauta para melhorar a baixa qualidade do SUS ? Contratar mais médicos para atuarem nas regiões mais remotas, inaugurar centenas de unidades ambulatoriais, inaugurar centenas de hospitais ... o que isso vai mudar para aqueles que já tem hospital e médico no seu bairro e não são atendidos com qualidade ? O que isso ajuda a mãe que hoje tenta levar seu filho no pronto socorro que já existe no seu bairro e não consegue atendimento ?
Vamos nos perguntar: o que está na pauta para melhorar a baixa qualidade da saúde suplementar ? Multar e suspender a operadora ... o que isso mudou para aqueles que tiveram seu tratamento negado ? O que isso mudou para aqueles que ouvem do médico que só fazem o procedimento se pagar os honorários à parte porque o plano de saúde paga muito pouco ?
Infelizmente a agenda, tanto na saúde pública quanto na saúde privada, continua sendo expandir o que não funciona !!!
Como costuma dizer um grande amigo: tudo como antes no quartel de Abrantes !.
E como nada muda, é fácil prever que a saúde vai continuar piorando: 2014 só será melhor que 2015, 2016, 2017 ...
Enquanto 100 % das atenções focam a cotação do dólar, nós que atuamos no segmento da saúde só podemos dizer Infeliz Ano Novo para todos nós.