O setor de saúde está cada vez mais atento à importância de melhorar a experiência do paciente, colocando-o no foco central, e de engajá-lo em seu cuidado e tratamento. Esse, inclusive, é o tema escolhido pela Healthcare Business Unit da UBM Brazil para seus eventos – Hospitalar, Healthcare Innovation Show e Saúde Business Fórum – do ano que vem.
Para falar um pouco mais sobre o conceito de engajamento dos pacientes, como as tendências atuais influenciam o setor e o que as instituições podem fazer para adotar essa nova corrente de pensamento, a equipe da Hospitalar entrevistou Kelly Cristina Rodrigues, especialista na área e diretora-executiva do Patient Centricity Consulting.
Confira:
HOSPITALAR: Por que o conceito de engajamento do paciente ganhou tanta importância?
KELLY RODRIGUES: Estamos vivendo em uma nova era gerada por vários fatores, como o acesso a informação, e isso mudou a maneira como todas as relações se constituem, inclusive na área de saúde.
Para exemplificar, há cerca de 20 anos, quando não tínhamos acesso à internet, às mídias sociais e outras tecnologias, o médico era o único detentor do conhecimento na área da medicina. Isso fazia com que o paciente acreditasse e obedecesse exatamente o que ele recomendava.
Hoje, de uma forma geral, o paciente é mais esclarecido sobre sua patologia (sobretudo porque realiza uma pesquisa prévia) e espera do médico e dos profissionais de saúde outros comportamentos, como um atendimento personalizado e o entendimento de quem é o paciente, e não somente visualizando a sua doença.
H: Como essa tendência influencia o setor de saúde?
KR: A tendência no Brasil, no sentido desse engajamento, deriva de novas necessidades que estamos trilhando por aqui, como a atenção centrada no paciente e na sua experiência. Esses são alguns conceitos já antigos, mas que, na verdade, nunca foram explorados em sua plenitude. Agora, com a importância de colocar o paciente no centro e engajá-lo no cuidado, começamos a nos preocupar com algumas questões que já são priorizadas na prática há mais de duas décadas ao redor do mundo.
Nos Estados Unidos, por exemplo, a questão do engajamento do paciente tem uma grande importância e está muito relacionada à forma de remuneração – value-based healthcare ou remuneração baseada em valor, em português. Em outras palavras, quanto menos o usuário estiver envolvido em seu cuidado, mais ele utilizará o sistema de saúde e menos resultado financeiro teremos.
Já na Europa, a questão do engajamento também é essencial, mas tem um apelo forte relacionado ao resultado clínico, ou seja, ao desfecho do cuidado prestado. Quanto mais o paciente for parceiro e se envolver no tratamento, melhores resultados clínicos serão alcançados.
H: Como as instituições de saúde podem engajar seus pacientes?
KR: Temos que, essencialmente, trabalhar alguns pilares importantes não somente com o paciente, mas também com os corpos clínico e assistencial das instituições. Alguns exemplos são a aplicação de treinamentos, para que os colaboradores estejam inseridos neste tema e possam trabalhar com diretrizes claras e a promoção de educação em saúde, que significa educar os pacientes para que entendam sua patologia e o impacto que fazer ou não algo recomendado pelos especialistas tem em sua saúde.
Além disso, também realizar um tratamento coordenado, para o qual a equipe deve articular um plano de ação, com o paciente no centro deste planejamento, e um tratamento personalizado, entendendo que, por mais protocolos que tenhamos, o atendimento deve ser individualizado, realizado de acordo com as necessidades daquele indivíduo e focado na pessoa, não na doença. Isso faz toda a diferença no resultado clínico.
H: Quais mudanças – de mentalidade e, consequentemente, de comportamento – as instituições e a sociedade como um todo devem promover para adotar o conceito de engajamento de forma natural?
KR: Falando das instituições, mudar a cultura organizacional é de suma importância. Elas precisam oferecer diretrizes claras do que esperam de seus colaboradores (desde o corpo clínico ao assistencial) e atuar de forma transformacional com exemplos. Quando a cultura é clara, a tendência é que os colaboradores se encaixem de forma natural.
Além disso, precisamos entender que a nossa profissão existe porque temos pacientes, e não apesar deles. Essa é a principal mudança de mentalidade, de que o paciente deve ser o foco central. Isso não significa que os demais stakeholders não sejam importantes, como os médicos, por exemplo. Esses sempre serão alguns dos principais. No entanto, na experiência do paciente, temos que olhar para todos – médicos, pacientes, familiares, colaboradores e instituições – e ter uma estrutura que seja plena e factível para todos.
Quando penso no aspecto de engajamento, olhando para a sociedade, imagino que a necessidade maior seja inserir essa questão de forma educativa nas escolas. Precisamos formar pessoas que entendam a importância do seu papel e do seu comportamento no impacto de sua saúde.