Nos últimos tempos, pudemos observar grandes avanços na quantidade de dados que frequentemente geramos em praticamente tudo o que realizamos, assim como a nossa capacidade de utilizar a tecnologia para analisá-los e compreendê-los assertivamente. O cruzamento dessa tendência é denominada de “Big Data” e está ajudando as empresas do segmento de saúde a se tornarem mais eficientes e produtivas.
Com a crescente expansão e envelhecimento da população mundial, os modelos de entrega estão mudando, e muitas das decisões por trás dessas mudanças estão sendo conduzidas pelos dados.
Para a discussão da aplicação do Big Data nos cuidados de saúde, conversei com Lilian Quintal Hoffmann, Superintendente-Executiva de Tecnologia da Informação da BP – Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Sobre as barreiras que ainda dificultam o uso pleno dos grandes dados por parte das organizações de saúde no Brasil, Lilian destaca que sim, ainda existem fatores que comprometem o uso pleno dos dados e aponta a própria ausência das informações, passando pela qualidade dos dados chegando até à inexistência de uma estratégia data driven nas instituições. Com relação aos dados clínicos, a dificuldade de interoperabilidade faz com que as informações sobre o indivíduo e de sua saúde fiquem fragmentadas dentro das diversas organizações que compõem o sistema, o que não permite a análise global de sua saúde. E ressalta que embora a maioria dos dados contidos nos prontuários eletrônicos dos clientes não sejam estruturados, hoje já é possível aplicar tecnologia que permita a extração e utilização destes dados. Para ela a tendência é que estas tecnologias caiam de preço e permitam ampla usabilidade, fomentando assim o uso dos dados.
Entretanto, ao contrário de outras indústrias, a saúde adota uma abordagem cautelosa para a adoção de novas tecnologias. Questionada sobre como as análises preditivas podem contribuir para os cuidados de saúde e como isso remodela os modelos de negócios e a jornada do paciente, a Superintendente avalia que as análises preditivas permitem ações planejadas que, salvo, exceções tendem a ser menos custosas e mais acertadas. Além de afirmar que ao utilizarmos dados para gerarmos a predição, por exemplo, de uma piora clínica de um cliente, podemos antecipar condutas que garantam melhor qualidade no atendimento e, consequentemente, uma melhor experiência para o cliente. “Hoje não há dúvidas que não basta armazenar os dados: é necessário estudá-los e utilizá-los para as decisões”, diz Lilian.
Recentemente, na edição de março de 2017 da revista Harvard Business Review Brasil foi publicado um artigo intitulado: “Como a aprendizagem de máquinas está ajudando a prever doenças cardíacas e diabetes” no qual é relatado que alguns hospitais de Boston (EUA) elaboraram um estudo em que era possível prever a possibilidade de reinternação dos pacientes com doenças cardíacas e diabetes com um ano de antecedência. Para esse estudo os autores utilizaram dados de anonimizados de clientes e chegaram a uma acurácia de 82%, superando a famosa pontuação de Framingham, que prevê hospitalizações com precisão de cerca de 56%.
“Em um mundo digital não há mais espaço para se trabalhar considerando o dado apenas como um elemento burocrático de armazenagem de informação”, destaca Lilian.
Com relação a transformação digital nas instituições é necessário que ela se inicie nas áreas em que há possibilidade de redução de custo e aumento de produtividade para, em um segundo momento, evoluir para uma integração digital completa, com estratégias de uso e análise de dados avançadas. Acerca desse processo dentro da BP – Beneficência Portuguesa de São Paulo, para ela isso trata-se de um caminho natural na área de saúde que implica na automação de processos que gerem eficiência e controle de custos primeiramente. No entanto, é preciso que as instituições também comecem a se preocupar com a experiência do cliente, com o seu empoderamento, com o uso dos dados para garantir segurança e melhores tomadas de decisões clínicas e de gestão. Lilian sinaliza que a BP se encontra em um momento de aprimorar a experiência de seus pacientes, trabalhar com os dados armazenados para assegurar melhores decisões estratégicas e de assistência, para assim repensar modelos de negócio e usar o digital para agregar valor aos clientes.
Dentro desse cenário, muitas organizações de saúde encaram o uso de dados como burocracia ou não veem seus reais benefícios. Ela aponta que isso se trata de uma questão de tempo, uma vez, que se as instituições não mudarem, serão mudadas, nem que seja para serem extintas. “O ideal é mudar experimentando, criando condições para a mudança, mostrando valor, modificando cultura, errando rápido e corrigindo mais rapidamente ainda. Os clientes de hoje (e do futuro) agradecem”, finaliza Lilian.