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Quando o preço do remédio impede o tratamento...

O mais recente encontro da Sociedade de Oncologia Clínica, em Chicago, teve palestra de abertura do professor de negócios de Harvard, Michael Potter, autor do best-seller “Repensando a Saúde”. As reflexões que preocuparam os mais de 30 mil médicos presentes são pelo problema que vem crescendo há anos e, agora, colidiu com a prática médica: a saúde ficou cara demais.

Quando remédios deixam de ser usados por questão econômica, é inevitável que a discussão entre na pauta de eventos médicos. Se o problema é realidade em países ricos, é maior no Brasil. Mesmo que a Constituição brasileira seja clara – saúde é um direito de todos e dever do Estado – esta prerrogativa bem-intencionada é, em última análise, irrealista. O sistema é insuficiente e subfinanciado e a população envelhece e adoece mais. Médicos acostumados a abordar questões pessoais e delicadas, como funcionamento do intestino ou função sexual de alguém, não são treinados para falar sobre a possibilidade de um paciente – ou do sistema de saúde – pagar pelo seus exames e remédios.

Nas análises, ainda tímidas, de custo-efetividade existem várias incertezas. Efetividade esbarra no potencial viés de uma agenda científica que tem necessidade de gerar resultados econômicos para os investidores. No que diz respeito a custos, o sistema de saúde não os tem medido em todo circuito de assistência. Pelo contrário, as medidas geralmente são parciais, fragmentadas e com base em preços.

As formas de mudar essa balança de custo e efetividade são reduzindo custo – improvável neste cenário de alto investimento para cada produto novo – ou aumentando efetividade através da identificação de quem é o melhor respondedor ao tratamento. Aqui que a medicina personalizada ou, também conhecida como medicina de precisão, ganha espaço.

Identificação de um gene específico, cujo um dos exemplos mais interessantes é uso de panitumumabe e cetuximab em câncer de cólon em pacientes com gene NRAS sem mutação (que sucede um modelo prévio com uso exclusivo de pesquisa de mutação de outro gene chamado KRAS). Esta abordagem permitiu melhor assertividade, reduzindo custos desnecessários e melhorando resultado para aqueles expostos a terapia. Os dados não só mostraram aumento de sobrevida global quando o medicamento é usado em associação com quimioterapia convencional, mas revelou que o uso desta linha de remédios sem essa informação pode ser deletéria! Tem todo sentido, mas corremos o risco de esbarrar em uma questão prática: os órgãos reguladores exigem estudos comparativos (por definição, conhecidos como fase III) e nestas condições de hiper categorização de doenças, essa construção científica pode ficar inviável. É um impasse que vai demandar redefinição de critérios burocráticos.

Em uma análise mais ampla, o desafio é garantir equidade. A palavra “insustentável” é usada com tanta frequência, que deixou de causar impacto. Uma forma sensata de buscar solução é parametrizar conceitos científicos (o que é valor em saúde?) e desestigmatizar estas questões em debates com a sociedade. Boa medicina não é simplesmente empilhar tecnologias, mas fazer as escolhas certas. O dilema é mundial e o Brasil não só deve estar presente, como deve acelerar a discussão que assola de forma mais evidente nossos cofres maltratados e raspados.