AACD contrata executivos e estuda como ampliar receita
Por Beth Koike | De São Paulo
João Octaviano Machado Neto (ex-Prodam) é o novo CEO da AACD: "Temos metas e indicadores a cumprir"
A Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD) passa a contar com uma gestão profissionalizada a partir do fim deste mês. A nova equipe, formada por cinco superintendentes e um CEO, substitui 25 diretores e um presidente que atuaram como voluntários nos últimos seis anos. É a primeira vez em seus 62 anos de atividades que a AACD tem no comando executivos contratados.
A principal meta da nova diretoria é tornar a AACD uma entidade totalmente autossuficiente, sem dependência das doações - que é a base de sua origem. Hoje, 87% do faturamento de R$ 280 milhões da entidade é proveniente da receita do Hospital Abreu Sodré e das vendas de produtos ortopédicos, que somaram R$ 15 milhões no ano passado. Com isso, as doações representam apenas 13% da receita bruta. Deste total, 9% vem das doações obtidas com o programa Teleton e 4% de outros doadores.
"Temos metas e indicadores a cumprir. Caminhamos para ser uma entidade com orçamento de R$ 300 milhões e precisamos estar bem estruturados", disse João Octaviano Machado Neto, CEO da AACD. "Mas não queremos, de forma alguma, perder o vínculo com os doadores e voluntários que são os responsáveis pelo sucesso da entidade até hoje", complementou ele que, anteriormente, era presidente da Prodam, empresa de tecnologia da Prefeitura de São Paulo. A ideia é que as doações sejam uma receita complementar.
Machado Neto foi contratado há um ano pelo presidente do conselho Horácio Lafer Piva (ex-Fiesp), e pelo presidente, Eduardo de Almeida Carneiro. Ambos anteciparam o fim do seus mandatos que terminaria em dezembro e em junho, respectivamente, para antecipar o processo de profissionalização.
Para o lugar de Piva foi indicado o nome de Regina Helena Scripilliti Velloso, que há 15 anos é voluntária na entidade e é sobrinha de Antônio Ermírio de Moraes. A Votorantim, ao lado dos bancos Itaú e Bradesco, é uma das maiores doadoras da AACD. A família Ermírio de Moraes tem forte tradição na área da saúde. O primogênito José era voluntário no Hospital do Câncer; seu irmão Antonio, na Beneficência Portuguesa; e o cunhado Clóvis Scripilliti (marido de Maria Helena), na AACD. A terceira geração tem acompanhado essa tradição de ações sociais em saúde.
A estratégia da AACD de não depender tanto das doações não é à toa. Nos últimos anos, as entidades beneficentes vêm tendo mais dificuldade para obter doações de pessoas jurídicas. Isso porque muitas companhias e bancos criaram suas próprias instituições de responsabilidade social e se tornaram mais exigentes quanto à destinação de recursos. "Hoje, há uma consciência social maior, mas há também uma maior competição por recursos. Muitas empresas, por exemplo, investem em ações sociais nas regiões em que estão construindo fábricas", disse Carneiro, que preside a AACD até o dia 23.
Diante desse cenário, Carneiro e Piva assumiram seus mandatos há seis anos já com o intuito de profissionalizar a gestão. Outro fator que motivou essa decisão é que a entidade operava em 2006 com um déficit de quase de R$ 4 milhões para um orçamento de R$ 150 milhões. No ano passado, a AACD reverteu o resultado e fechou com superávit de R$ 18 milhões e uma receita bruta de R$ 280 milhões.
Já como parte do plano de crescer 10% em 2012 e atingir a autossuficiência nos próximos anos, a AACD adquiriu no fim de março a Lar Escola São Francisco, entidade que também é referência no tratamento de portadores de deficiência física e adicionará um faturamento anual de R$ 22 milhões à AACD. Com uma gestão familiar, o Lar Escola São Francisco enfrentava problemas financeiros, com um prejuízo de aproximadamente R$ 3 milhões em 2011 - resultado que a nova administração pretende reverter.
A AACD também está estudando outras formas de captação de recursos. Entre elas, estão a venda de um terreno de 1,5 mil m2 na Vila Mariana, em São Paulo, ou a construção de uma faculdade de fisioterapia nesse imóvel (que pertencia ao Lar Escola São Francisco) e a ampliação do hospital Abreu Sodré. "Estamos estudando várias possibilidades de investimento. Agora, entramos em uma nova fase do terceiro setor em que é possível ter investimentos com fins lucrativos com retorno todo revertido para a AACD", explicou Machado Neto.
A busca por maior rentabilidade visa cobrir o déficit do SUS, que paga uma parcela pequena dos procedimentos médicos. No Hospital Abreu Sodré, 50% dos atendimentos são de pacientes do SUS e a outra metade, de pessoas com plano de saúde. O maior déficit vem do centro de reabilitação da AACD em que 99% dos atendimentos são gratuitos e acarretam um prejuízo anual de R$ 20 milhões.
Outra ideia na mesa dos conselheiros e executivos da AACD é a criação de um centro de pesquisa para tratamento e busca da cura de algumas deficiências motoras em parceria com universidades e institutos de estudos locais e internacionais. "Hoje, já apoiamos muitas pesquisas e temos pessoal extremamente qualificado. Queremos deixar de ser o braço e nos tornar o cérebro", disse Carneiro.
Fonte: Beth Koike, Valor Econômico, 13/04/2012