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A remuneração médica e o socialismo

Os últimos acontecimentos das eleições no Brasil motivaram a circulação de muita coisa na internet.

Muito lixo, mas com bom escrutínio, podemos aproveitar algumas coisas.

Separei um artigo que recebi a respeito de um professor de economia que certa vez reprovou uma classe inteira. Ele conta a história desta classe em particular que havia insistido que o socialismo realmente funcionava: com um governo assistencialista intermediando a riqueza ninguém seria pobre e ninguém seria rico, tudo seria igualitário e justo.

O professor então disse, "Ok, vamos fazer um experimento socialista nesta classe. Ao invés de dinheiro, usaremos suas notas nas provas”. Todas as notas seriam concedidas com base na média da classe, e portanto seriam 'justas'. Todos receberão as mesmas notas, o que significa que em teoria, ninguém será reprovado, assim como também ninguém receberá um "A".

Depois de calculada a média da primeira prova todos receberam "B". Quem estudou com dedicação ficou indignado, mas os alunos que não se esforçaram ficaram muito felizes com o resultado.

Quando a segunda prova foi aplicada, os preguiçosos estudaram ainda menos - eles esperavam tirar notas boas de qualquer forma. Já aqueles que tinham estudado bastante no início resolveram que eles também se aproveitariam do trem da alegria das notas. Como resultado, a segunda média das provas foi "D". Ninguém gostou.

Depois da terceira prova, a média geral foi um "F". As notas não voltaram a patamares mais altos, mas as desavenças entre os alunos, a busca por culpados e palavrões passaram a fazer parte da atmosfera das aulas daquela classe. A busca por 'justiça' dos alunos tinha sido a principal causa das reclamações, inimizades e senso de injustiça que passaram a fazer parte daquela turma. No final das contas, ninguém queria mais estudar para beneficiar o resto da sala. Portanto, todos os alunos repetiram aquela disciplina... Para sua total surpresa.

O professor explicou: "O experimento socialista falhou porque quando a recompensa é grande o esforço pelo sucesso individual é grande. Mas quando o governo elimina todas as recompensas ao tirar coisas dos outros para dar aos que não batalharam por elas, então ninguém mais vai tentar ou querer fazer seu melhor...”

Não consegui ler isso sem fazer um paralelo com o modelo de remuneração que temos hoje vigente na maioria dos planos de saúde e em 100% das cooperativas médicas. Onde os honorários são tabelados e todos os médicos recebem um valor igual e “justo” pelo seu trabalho. Será isso um modelo socialista?

Obviamente fugimos do conceito geral do socialismo, pois o médico que trabalhar mais ganhará mais. E aí está o lado pernicioso de nosso modelo: o ganho por procedimento. Como vimos mesmo o ganho individual por procedimento sendo igual, a diferença acaba se dando pelo volume. Qual o resultado disso? super-utilização ou ainda “incentivo por estilos de práticas inconsequentes de custos”, como disse Robinson há mais de 20 anos.  Pelo lado do pagador, a sinistralidade aumenta e medidas cada vez mais agressivas de regulação acontecem. Pelo lado dos médicos, eles se sobrecarregam para não comprometer mais o seu padrão de vida ultrapassando até o seu limite físico (veja meu artigo “O Médico Cansado”).

O altruísmo é uma característica que faz parte da imensa maioria dos médicos, e toda esta questão de “remuneração justa” é esquecida por um tempo, pois os que se destacam na qualidade do serviço que prestam, são compensados por mais procura de pacientes. E isso é gratificante. Só que chega a um ponto que, por mais altruísta que o médico seja, ele faz uma conta básica: é melhor (e mais saudável) atender um paciente à R$ 150 do que três pacientes à R$ 50 cada! E acontece o que estamos observando nas grandes cidades: os médicos passam a não mais atender os convênios ou a limitar absurdamente ao acesso dos pacientes conveniados a seus consultórios.

Desta forma, uma simples e rápida análise faz perceber que o modelo de remuneração médica impacta diretamente o custo do sistema de saúde e a percepção de valor do paciente (reduzindo ou dificultando seu acesso aos serviços).

É importante deixar público que não sou contra a CBHPM. Só defendo veementemente que ela seja utilizada como referencial mínimo de remuneração e, a partir dela, acrescentar pagamentos diferenciados aos profissionais que gerarem mais valor aos seus pacientes.