Todo médico que se preze anda com um carimbo no bolso ou maleta. Pode ser um carimbo normal, um carimbo automático, até mesmo um carimbo que é uma caneta, afinal, sem esse poderoso instrumento ele simplesmente não é médico. Por mais incrível que pareça, mesmo em 2014, esse é o maior símbolo da medicina. Muitos consideram o estetoscópio -- talvez seja o maior deles --, mas para realmente fazer qualquer prescrição e permitir que a mesma seja aceita em qualquer farmácia é necessário carimbo. Mesmo que a legislação permita que o médico assine seu nome completo e coloque seu numero de conselho é praticamente impossível conseguir comprar medicamentos com essa receita como, por exemplo, antibióticos.
Nesse cenário, no mínimo absurdo, existe uma ferramenta pouco explorada: a assinatura digital. Pode parecer novidade para muitos, mas não é, ela existe há praticamente 15 anos com pouquíssimo uso. Os próprios conselhos de medicina já fornecem os novos CRMs em forma de smartcard a fim de aumentar o uso da tecnologia, porém não informam ao médico para que serve o chip ao lado da foto, ou seja se o médico não procurar um certificador autorizado, como o Serasa ou Certisign ele não servirá para nada e o carimbo continuará a ser a mais moderna forma de provar que a receita foi emitida pelo próprio médico. Agora imaginem o que realmente ocorre nesse reinado do carimbo, onde qualquer pessoa nesse país pode fazer o carimbo que bem entender sem comprovar nada. Qual a quantidade de prescrições e atestados falsos emitidos por médicos que podem nem sequer estar vivos?
O uso da assinatura digital nas prescrições altera todo o cenário atual fornecendo segurança ao médico e usuário, eliminado a necessidade da cópia física da receita, pois a mesma pode ser emitida por um computador, assinada digitalmente e ir para as nuvens, onde as farmácias poderão consultar e fornecer o que realmente foi prescrito, sem contar a dificuldade de leitura da famosa “letra de médico”. Diante disso, urge uma necessidade de ampliarmos a prescrição e assinatura digital como forma de acabar com o reinado da burocracia do carimbo e modernizarmos e aumentarmos a segurança para o usuário, médicos e farmacêuticos.
O Brasil já deu o seu primeiro passo no sentido de quebrar este paradigma, com a autorização dada pelo Ministério da Saúde à prescrição digital como uma prática que deve ser incorporada no dia a dia do segmento médico, em todo o território nacional. Embora ainda pouca utilizada é simples, visto que ao substituir o papel pelo receituário eletrônico, gera-se um código de barras ou um QR Code que facilitará o trânsito deste medicamento no universo médico, desde os consultórios, até os fabricantes de medicamentos e farmácias, chegando ao paciente final. É através desse código de barras e com o CRM digital do médico e a sua assinatura digital, que todos os agentes envolvidos com a saúde têm muito a ganhar.
Para os próprios médicos, são inúmeras as vantagens. Imagine ter à seu serviço um banco de dados que mostre todas as opções de remédios disponíveis no mercado, e poder contar com as informações necessárias para optar entre um medicamento de referência, similar ou genérico. O mesmo sistema ainda dá a chance do profissional acompanhar o uso do medicamento. Por exemplo: no caso de prescrição de duas ou mais caixas do medicamento, é possível levantar as datas em que foram adquiridos, para checar se houve o espaço correto entre as compras, de forma que o processo terapêutico não tenha sido comprometido. Ainda é possível saber, se o remédio é fornecido por algum programa gratuito de governo, e se a medicação dispensada foi exatamente aquela que havia sido prescrita ou se a mesma foi trocada por genérico ou similar. A prescrição digital permite uma rastreabilidade que confere maior segurança à todo o sistema que é todo criptografado, a exemplo dos ambientes digitalizados dos bancos.
Para o paciente, o programa oferece agilidade, na medida em que permite uma leitura correta da receita, evitando qualquer equívoco, a pesquisa do preço do medicamento, a escolha da farmácia mais próxima, a entrega no domicilio e o pagamento online ou por meio de um serviço telefônico que também auxilia a compra do mesmo -- desde que o mesmo esteja de posse do código de barras, e do CRM do médico.
São muitos os motivos para comemorar. Resta saber se os principais atores desse processo irão contribuir aderindo cada vez mais à nova tecnologia e viabilizando que o sistema venha a ser amplamente adotado, deixando para trás, definitivamente, o tempo médico podia se valer apenas da sua caneta e de seu carimbo.