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As perspectivas do mercado de oncologia no Brasil

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Com alta demanda, novas tecnologias e tratamentos, desafio está na prevenção e no equilíbrio de custos

Para cada ano do triênio 2023-2025, segundo a publicação Estimativa 2023 – Incidência de Câncer no Brasil, produzida pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA), são esperados 704 mil casos novos da doença no país, com destaque para as regiões Sul e Sudeste, que concentram cerca de 70% da incidência de casos.

No triênio 2020-2022, eram esperados 625 mil novos casos de câncer por ano no Brasil, ou seja, com a nova estimativa, a cada ano serão registrados 79 mil casos a mais. As respostas para esse aumento, segundo a Organização Pan-Americana de Saúde, podem estar, além de no próprio envelhecimento natural da população, nos hábitos de vida pouco saudáveis, como o consumo de tabaco e de álcool, dieta desequilibrada e sedentarismo, que são fatores de risco para a doença em todo o mundo.

Nas leis de mercado, a alta demanda por um serviço significa ampliação de oferta e, oportunidade de receita para as empresas. Um relatório do Itaú BBA, apontou que em 2021, o ticket médio de um paciente de um tratamento oncológico era de R$ 138 mil.

Daí os altos investimentos vistos nos últimos anos no segmento. Só em 2022, a Dasa investiu R$ 420 milhões, na área que soma hospitais e oncologia. No segundo trimestre de 2023, o resultado do segmento oncológico representou um crescimento de 36% em relação ao mesmo período do ano passado na empresa.

Na Rede D’Or, no relatório divulgado, a receita acumulada no primeiro semestre na área é de R$ 1,3 bilhão, um incremento de 21,3% em relação ao mesmo período no ano passado. A Oncoclínicas comemorou, nesse período, a expansão de 31% do faturamento orgânico da companhia.

Impacto nos custos

Paralelamente a esse aumento no número de pessoas diagnosticadas, crescem também os investimentos em novas ferramentas diagnósticas e em novos tratamentos, cada vez mais eficientes e com menos efeitos colaterais, porém, com custos cada vez maiores para a saúde pública e privada.

O estudo “Quanto custa o câncer?”, produzido em uma parceria entre o Observatório de Oncologia, o Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz (CEE) e o Movimento Todos Juntos Contra o Câncer, apontou que, nos últimos quatro anos, aumentou em 400% o custo médio dos procedimentos de tratamento da doença, como a quimioterapia, radioterapia e imunoterapia.

Para Nina Melo, coordenadora do estudo e também coordenadora sênior de pesquisa da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), esse aumento pode encontrar resposta em duas hipóteses. “A primeira é a incorporação de novas tecnologias no Sistema Único de Saúde (SUS), com moléculas mais avançadas e, consequentemente, mais caras. E a segunda, a mais preocupante, é o aumento no número de diagnósticos avançados, o que eleva o custo do tratamento do câncer por exigir mais linhas de tratamento, mais intervenções e intercorrências como internação, por exemplo.”

Só em 2022, os gastos com o tratamento do câncer no SUS foram de R$ 4 bilhões, o que representou 3% dos recursos totais destinados à saúde no Brasil. Neste valor estão incluídos procedimentos ambulatoriais, internações e cirurgias, e também as terapias inovadoras incorporadas ao SUS nos últimos anos.

“No entanto, há muitas outras coisas que ainda poderiam ser incorporadas, pois para alguns tipos de câncer, o tratamento no sistema público ainda é muito diferente do tratamento do sistema suplementar, como é o caso do mieloma múltiplo, por exemplo. Por outro lado, há que se pensar na sustentabilidade do sistema como um todo. Essa é uma discussão complexa que não pode ser pautada apenas por um estudo. Os gastos com câncer vão muito além de R$ 4 bilhões, pois envolvem promoção e prevenção, cuidados paliativos e reabilitação, por isso não podemos afirmar se este valor atende à demanda atual”, explica Nina.

Segundo estimativas publicadas recentemente no Jama Oncology, a expectativa é que sejam gastos com tratamentos oncológicos mais de US$ 25 trilhões, até 2050, em 204 países. No Brasil, o Inca estima que, até 2040, o gasto do SUS com os vários tipos de câncer chegarão a quase R$ 8 bilhões. “A tendência de aumento nos gastos com a doença é global, já que a incidência por câncer vem aumentando em todo o mundo. Para que essas projeções e demanda futura não impactem o sistema, é possível que haja ações coordenadas e um plano de enfrentamento do câncer, levando em conta todas as especificidades regionais e financeiras que existem no Brasil”, avalia Nina.

Como manter a sustentabilidade do sistema de saúde

O investimento em prevenção, principalmente na secundária, na opinião de Nina, pode ajudar a gerar economia ao sistema de saúde e mais qualidade de vida ao paciente. “Investindo em prevenção, por meio do rastreamento, temos a possibilidade de aumentar os diagnósticos precoces que vão não só trazer uma economia para o sistema, mas aumentar as chances de cura e qualidade de vida do paciente, fazendo com que ele continue ativo e contribuindo economicamente para a sociedade.”

Além da prevenção, Nina aponta, de maneira direta, como manter o sistema de saúde sustentável: sendo custo-efetivo. “Se, ao se agregar o custo da incorporação de uma nova tecnologia isso leva a um desfecho clínico superior, acredito que essa opção deva ser avaliada. E quando me refiro a desfecho, estou falando de desfechos oncológicos ou não oncológicos. Se tenho à disposição uma tecnologia que reduza as taxas de complicações durante a jornada terapêutica de determinada neoplasia, e isso leva a uma menor taxa de reinternações ou necessidade de procedimentos adicionais posteriores, a estratégia pode se mostrar custo-efetiva. Acho que estamos preparados para uma discussão mais abrangente, inclusive avaliando o que já temos incorporado, para definir se, de fato, faz sentido uma nova tecnologia. Ainda existe muito desperdício na oncologia.”

Importância da prevenção

Prevenção e promoção à saúde são alguns dos pilares da SulAmérica Saúde. “A prevenção inclui desde a incorporação de hábitos saudáveis até o uso de equipamentos de proteção individual (EPIs) para funções que tenham contato com substâncias carcinogênicas, como é o caso do agrotóxico, por exemplo”, comenta Tereza. “Em relação a isso, a SulAmérica faz diversas campanhas para que os beneficiários procurem incluir práticas mais saudáveis no seu dia a dia. Essa também é uma recomendação médica em todas as consultas”, explica Tereza Veloso, diretora técnica de Operações e Rede Credenciada.

No que se refere a diagnóstico precoce, a operadora atua em duas frentes: na conscientização dos beneficiários e na qualificação da rede sobre a importância de realizar os exames de rastreamento como mamografia, Papanicolau, PSA, entre outros.

Na opinião de Tereza, é preciso, além de investir em prevenção e promoção à saúde, também racionalizar o uso de medicamentos para pacientes em cuidados paliativos e ampliar as campanhas que alertam sobre o uso consciente do sistema de saúde suplementar, evitando fraudes e desperdícios.

A SulAmérica também tem feito uso de tecnologias, como inteligência artificial e big data, na jornada do paciente dentro do sistema para identificar casos em que é possível atuar precocemente por meio da análise dos diagnósticos. Essa iniciativa só é possível com o consentimento do beneficiário, respeitando a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

Investimentos em parcerias

Diante desse quadro de aumento no número de casos da doença e dos custos cada vez mais elevados de tratamento, grandes grupos de medicina e saúde têm se unido em parcerias focadas em serviços oncológicos.

No ano passado, A BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo -, o Grupo Bradesco Seguros e o Grupo Fleury anunciaram a criação de uma companhia dedicada a esse segmento. O objetivo é ser um serviço de referência em rastreamento, prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação.

A nova empresa, que deverá contar com clínicas e câncer centers em diferentes cidades do Brasil, tem como meta atuar de maneira disruptiva e fazer toda a trilha de acompanhamento do paciente, visando, além de proporcionar a melhor assistência, entregar um modelo de excelência na coordenação de cuidado em toda a jornada do paciente. Isso, espera-se, contribuirá com a sustentabilidade do sistema de saúde em virtude da melhor utilização dos recursos disponíveis, viabilizando um modelo de custos adequados.

O papel da medicina diagnóstica no futuro do tratamento oncológico

Com terapias cada vez mais personalizadas e tecnológicas, bem como a necessidade de investimentos contínuos em pesquisa e tratamentos, um dos maiores desafios da oncologia está na democratização do acesso. Encontrar maneiras de prover a melhor jornada de cuidados para o paciente com câncer é uma das principais necessidades para o setor.

“O rastreamento preventivo orientado por critérios clínicos ainda é o que temos de melhor e mais acessível para o diagnóstico de alguns tumores de elevada incidência, como mama e próstata, em sua fase inicial. Os testes genéticos também são grandes aliados para a identificação precoce do câncer, pois analisam o DNA a partir de amostras de sangue ou saliva em busca de alterações genéticas hereditárias que aumentam o risco para determinados tipos de câncer. Além do diagnóstico preditivo, exames genéticos do DNA tumoral também ajudam na identificação do melhor tratamento, dado que as novas terapias, em geral, têm alvos moleculares específicos que são identificados por esses testes”, explica Edgar Gil Rizzatti, presidente de Unidades de Negócios Médico, Técnico, de Hospitais e Novos Elos do Grupo Fleury.

Essas inovações diagnósticas podem auxiliar na estratificação de risco hereditário para determinados tipos de câncer em fases cada vez mais precoces, no estadiamento do tumor e na estratificação de risco do paciente, e no direcionamento do tratamento. Tudo isso de maneira cada vez menos invasiva.

“A biópsia líquida é um bom exemplo disso, pois se trata de um método com alta eficácia, realizado por meio uma amostra de sangue, sem necessidade de biópsia do tumor. Esse exame, totalmente não invasivo, permite a análise de diferentes genes e variantes em frações diminutas do DNA tumoral circulante, quase sempre presente.”

Outra inovação apontada por Rizzatti é o Oncofoco, um exame direcionado a pacientes oncológicos que necessitam de uma alternativa terapêutica. Por meio de algoritmos de inteligência

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artificial, o Oncofoco avalia as alterações existentes em 421 genes e regiões de fusões de 50 genes, gerando, em poucos segundos, um relatório com dados de ensaios clínicos presentes na literatura médica mundial e uma lista de medicamentos ou tratamentos que podem responder às alterações genômicas encontradas no tumor sob avaliação.

Rizzatti destaca ainda que um dos maiores desafios em relação aos métodos diagnósticos mais modernos está na incorporação das novas tecnologias que estão surgindo e, paralelamente a isso, buscar a democratização do acesso.

“Em alguns casos, os novos testes de vanguarda passam por etapas de análise fora do Brasil, o que torna mais elevado tanto o custo quanto o prazo de liberação dos resultados, um aspecto crítico em oncologia. Temos buscado maneiras de reduzir custos e prazos, seja pela internalização desses testes que inicialmente são feitos fora do país, seja por meio de parcerias com diferentes entes da cadeia de saúde, com o objetivo de ampliar o acesso e beneficiar mais pacientes.”

Para o futuro, ele avalia que a medicina será cada vez mais personalizada e integrada, com foco no melhor desfecho clínico para o paciente. “A construção dessas soluções integradas passa por quatro etapas que personalizam a jornada do paciente e entregam uma experiência melhor e mais eficiente na utilização dos recursos de saúde: entender a necessidade, desenhar a solução, engajar o paciente e escalar e produtizar (elaborar soluções e facilitar a transição entre as etapas). No Grupo Fleury, olhamos para todo o processo, desde o rastreamento, passando pelo diagnóstico, estadiamento e acompanhamento”, conclui Rizzatti.

Perspectivas para o futuro da oncologia

Nina acredita ser possível equilibrar o melhor resultado ao paciente, os custos com as novas tecnologias e os custos em saúde de maneira sustentável. “Tudo faz parte de uma cadeia, na qual se precisa caminhar de forma coordenada. É muito simples: se o recurso é um só e eu prevaleço uma área ou alguns, automaticamente a outra vai ficar deficiente. Os processos de incorporação no Brasil hoje já levam em conta a questão de custo-efetividade, mas, ainda assim, nem tudo o que é de fato incorporado chega até o paciente. Em um sistema universal como o nosso é difícil gerir esse financiamento versus a demanda, por isso, todos temos responsabilidade na gestão deste recurso, que é finito. Atualmente, temos tido custos exorbitantes com judicialização, por exemplo. Por isso, executivo, legislativo e judiciário precisam caminhar juntos em um plano que vise trazer esse equilíbrio.”

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O aumento progressivo e desenfreado dos custos na cadeia da assistência oncológica é um problema sério e sistêmico, na opinião do Dr. Walter Henriques da Costa, oncologista do A.C. Camargo Cancer Center. “A incorporação de novas tecnologias e medicamentos, associada à ineficácia da gestão na área da saúde, tornam o sistema injusto (já que premia os excessos e o desperdício) e insustentável do ponto de vista econômico.  No A.C. Camargo Cancer Center, nos sentimos preparados para sermos protagonistas na transição de remuneração baseada em produtividade para remuneração baseada em valor. Estruturamos nosso Escritório de Valor com o intuito de, entre outros temas, gerar indicadores de custo-efetividade e de estruturação de jornadas e protocolos clínicos que possam ajudar na elaboração de bundles. Estamos seguros de que conseguimos entregar valor em oncologia associado a um custo bastante competitivo frente ao mercado.”

O que norteias as opções terapêuticas da instituição são protocolos clínicos desenhados pelo corpo de especialistas e baseados em evidência presentes em literatura médica. Ele também pontua que o desejo do paciente e família deve ser levado em consideração no momento da decisão do tratamento, desde que esteja amparado em um claro benefício clínico presente em estudos científicos e cujo custo adicionado à jornada clínica seja razoável.

Tereza, da SulAmérica, também destaca a aplicação de protocolos clínicos com fortes evidências de efetividade como fundamental para uma boa gestão financeira. Ela cita como exemplo os investimentos em um dos hospitais credenciados da rede, da Rede D’Or, que investiu recentemente R$ 80 milhões em um laboratório de patologia molecular com alguns equipamentos únicos na América Latina, em que é possível analisar o código genético do tumor dos pacientes, orientando para um tratamento mais assertivo. “Com isso, conseguimos proporcionar tratamentos mais rápidos e personalizados. A otimização e a precisão da jornada do paciente contribuem para a sustentabilidade do sistema.”

Dr. Costa, acredita que, para o futuro, o foco da terapia oncológica esteja voltado mais para a manutenção da qualidade de vida pós-tratamento e a redução das potenciais sequelas relacionadas ao tratamento. “Buscamos a resposta oncológica, sem dúvida, mas a que preço? Dentro da estrutura do nosso Escritório de Valor, temos nos dedicado a esse tema, com coletas periódicas e protocolares de questionários de qualidade de vida pós-tratamento oncológico. Estamos focando nos PROMs (do inglês, Patient Related Outcome Measures; em português, medidas de desfecho relatadas pelo paciente) para poder entender e contribuir com essa discussão de uma forma mais ampla.”