Descompasso entre Inflação Oficial e Inflação Real na Área da Saúde deverá ser bem maior no pós pandemia
Fonte: Geografia Econômica da Saúde no Brasil
(*) todos os gráficos são partes integrantes do estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil – Edição 2020
O gráfico ilustra a proporção da inflação da saúde medida na saúde suplementar em 2019.
Existem vários métodos para medir inflação:
· O mais famoso é o que tabula os preços dos itens mais comuns consumidos pela população ... este método tem muitos vieses;
· O maior é o fato de medir o preço que o vendedor declara e/ou expõe, que é diferente do preço que o comprador paga;
· O fato do produto estar com o preço fixado em 10 não significa que a venda será feita por 10. Pode haver desconto, e (maior dos vieses) o produto pode nem ser vendido – o vendedor quer vender por aquele preço, mas ninguém paga por aquele produto com aquele preço.
Quando se faz uma média de preço declarado de venda:
· Entra na conta o preço mais baixo do produto que foi muito vendido e o mais alto do produto que encalhou;
· Ele não considera a quantidade de produtos vendidos em cada preço;
· Em função disso a margem de erro em relação ao que realmente ocorre é grande.
No caso da saúde a indução ao erro é ainda maior porque o governo tabela preços de medicamentos, um insumo importante que na maioria absoluta das vezes não é comprado pelo preço tabelado, seja do fornecedor para o serviço de saúde, seja do serviço de saúde para a fonte pagadora.
No mercado geral as instituições não têm como tabular o preço realmente pago pelo comprador, mas na saúde temos, tanto na área pública como na privada ... e na privada é muito mais simples, diga-se de passagem:
· Temos as despesas assistenciais das operadoras de planos de saúde que representam o que elas realmente gastaram na assistência aos seus beneficiários;
· E temos o número de beneficiários das operadoras;
· Então podemos calcular o ticket médio por beneficiário, e avaliar a variação de um ano para outro.
O gráfico ilustra esta relação:
· Inflação Real é tudo que as operadoras gastaram para tratar seus beneficiários, dividido pelo número de beneficiários;
· Inflação AM é isolando apenas despesas e beneficiários da assistência médica;
· E Inflação AO é isolando apenas despesas e beneficiários da assistência odontológica.
Avaliando a evolução anual observamos:
· Que a inflação estava mantendo tendência de redução antes do COVID-19;
· O índice de inflação geral da saúde geralmente é maior que a inflação oficial, dos índices divulgados pelos governos, instituições especializadas e entidades de classe;
· E em anos em que existe queda de beneficiários a inflação sobe porque existe a tendência de abrir mão do plano de saúde por parte de quem necessita menos dele, ou seja, sobra uma parcela proporcionalmente maior de quem consume os serviços.
É um indicador forte (fantástico) porque independente das tabelas de preços envolvidas e os milhares de indexadores de cada contrato entre fonte pagadora e serviço de saúde, que definem preços totalmente diferentes caso a caso, é o que o comprador realmente pagou ao vendedor !!!
O indicador fica melhor se o cálculo:
· For feito por região ... as variações são significativas dependendo das diferenças regionais, que são enormes no Brasil;
· For feito por modalidade de operadora – o ticket médio por modalidade varia porque as fontes pagadoras não estão no mercado com o mesmo objetivo social, o que faz com que operadoras de alguns tipos se proponham a pagar mais pelos serviços que outras.
Mesmo no cálculo geral, sem estratificação, os vieses são muito pequenos quando comparados aos vieses do IGPM, IPC, IPCA & Cia. Ltda.
Os gráficos demonstram que o viés ao mesclar todas as modalidades em assistência médica é muito pequeno:
· O ticket médio assistencial das filantropias é muito menor, mas a quantidade de beneficiários é insignificante, e não afeta a análise;
· O ticket médio das seguradoras é maior que o das cooperativas e medicinas de grupo, mas a quantidade de beneficiários é menor – ponderando ficam muito próximos.
Analisando a evolução:
· A tendência é bem próxima da inflação geral da saúde;
· Mas os indicadores são maiores;
· Em 2019, por exemplo, enquanto a inflação geral girou em torno de 6,2 %, especificamente em relação à assistência médica ficou em torno de 8,4 % !
No caso da assistência odontológica:
· A diferença entre o ticket médio das cooperativas odontológicas e das odontologias de grupos também se compensam em relação ao volume de beneficiários;
· A compensação não é tão equilibrada como no caso da assistência médica, mas o viés também pode ser considerado pequeno na análise.
E o que é mais interessante:
· É nítido que a inflação no segmento da odontologia é muito menor;
· A explicação é sentida por todos: a expansão da adesão da população aos planos de saúde odontológicos ... um segmento que esteve em plena expansão nos últimos anos e “ainda têm jogo”, uma vez que o paradigma ainda está sendo quebrado em relação ao custo x benefício da adesão;
· As fontes pagadoras pagam muito menos pelos serviços odontológicos do que pagam os particulares, e o reflexo na inflação do segmento é impressionante;
· Algumas regiões do Brasil, já há alguns anos, experimentam deflação;
· E se observarmos os índices oficiais destas regiões, apontam inflação: fazendo coleta de preços verifica-se aumento, mas na prática a quantidade de pessoas que estão pagando menos pelo serviço é muito maior, ou seja, a inflação real é muito diferente da oficial.
Bem diferente dos índices oficiais de inflação, o da saúde representa:
· A variação dos preços dos produtos que sempre existiram;
· A incorporação de novos produtos;
· A variação de consumo por mudanças de protocolos e/ou perfil epidemiológico;
· E a expansão ou retração da adesão da população aos planos de saúde.
Estas particularidades é que encantam os que estudam a economia da saúde ... um capítulo à parte da economia geral ... não existe outro segmento tão dinâmico:
· Não é raro ver economistas que se perdem ao comentar a economia da saúde;
· Passamos a ver isso diariamente desde o início da pandemia no Brasil;
· Nos seus métodos tradicionais não conseguirão medir nada próximo da inflação real no pós pandemia ... o desabastecimento está fazendo serviços pagarem muito mais caro do que o preço tabelado / declarado;
· Máscaras, anestésicos, insumos para equipamentos ... tudo sendo vendido muito mais caro do que era ... longe do preço tabelado;
· E isso é repassado para o comprador ... a tabulação de preços, principalmente a dos preços tabelados, e uma catástrofe estatística ... a evolução do ticket médio vai demonstrar isso.
Ao encerrar na última semana os cursos da jornada da gestão em saúde que tinham como foco custos, rentabilidade e precificação, tivemos a oportunidade discutir uma metodologia simples para cálculo do ticket médio de faturamento, do ticket médio de custos e do ticket médio de rentabilidade de empresas, unidades de negócios e produtos ... não perdi de agradecer às dezenas de participantes e oportunidade de auxiliar os gestores de alguma forma a darem atenção a estes indicadores fundamentais para a sustentabilidade das empresas ... discutir o tema com gestores do segmento é muito gratificante: eles conhecem o segmento da saúde !!!