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Giovanni Guido Cerri e sua contribuição para a Saúde

Ele não só acompanhou como liderou o avanço da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, assim como do Hospital das Clínicas. A relevância de suas empreitadas também o colocou na Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Mais recentemente participou da criação do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP), fato que considera o desafio mais interessante de toda a sua gestão pública. Este é Giovanni Guido Cerri, ou melhor, professor Guido Cerri, que compartilha nas próximas páginas um pouco de sua história e visão sobre a Saúde brasileira.

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Como foi o seu desenvolvimento profissional na saúde?

Quando eu escolhi a especialidade de radiologia em 1976, ano em que me formei, eu peguei uma fase da radiologia que foi o grande salto da introdução de tecnologia na área. Era uma especialidade de relativa pouca importância, quando já se identificava no mundo que era uma especialidade que iria explodir nas próximas décadas. Naquela época, só existia raio-X na minha residência e tomografia de crânio havia sido instalada em 1995, na Beneficência Portuguesa. Tomografia já apontava ser uma técnica revolucionária, tanto que seu inventor já havia ganho o prêmio Nobel, mas o Brasil estava muito atrasado nesta incorporação tecnológica. Vendo que haviam poucas oportunidades aqui, eu resolvi ir para os Estados Unidos.

Eu acho que os fatores que me ajudaram a exercer uma liderança foram a especialidade em radiologia, que passou a ser uma especialidade muito importante dentro do contexto de saúde, assim como a minha experiência fora, que com a introdução da tecnologia que eu trouxe gerou a oportunidade de ter visibilidade e de participar de projetos para reestruturar a área de

imagem no Hospital das Clínicas e, posteriormente, no Brasil inteiro.

Como foi a trajetória de modernização da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e do Hospital das Clínicas?

Existem alguns marcos importantes.O primeiro marco importante foi quando assumi a diretoria da Faculdade de Medicina da Universidade

de São Paulo. Assumi esta diretoria porque havíamos conseguido promover uma grande mudança no departamento de radiologia, introduzindo algumas visões modernas, como a questão do PACS, uma radiologia mais digital, um projeto que teve grande resistência.

Os clínicos, principalmente os cirurgiões, resistiram muito no começo. Quando assumi a direção da Faculdade de Medicina o desafio era grande, o projeto da reforma tinha sido implantado, mas não havia florescido e aí nós conseguimos, com o apoio da sociedade, dar o grande salto da Faculdade de Medicina. Foi uma recuperação não apenas física, mas de ideias, as pessoas ficaram motivadas para trabalharem na faculdade.

Esse processo de 2002 a 2006 foi uma época muito produtiva, no sentido da Faculdade de Medicina e do Hospital das Clínicas voltarem à liderança inconteste. A recuperação da faculdade foi acompanhada de uma melhora na produção científica do HC.

Por que a sociedade resiste em apoiar iniciativas do poder público?

Porque não existe confiança em apoiar o poder público, pensa-se que o dinheiro não vai ser bem empregado ou desperdiçado. Lembro quando o Aloysio Farias (ex-dono do Banco Real) ao ver a situação de descuido da Faculdade perguntou “como se deixa um prédio desse

chegar a esse ponto?”.

Não é porque é público que não tem que ser limpo, arrumado e bem-cuidado. E esse foi o princípio que nós utilizamos no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP) e na Secretaria do Estado de Saúde de São Paulo. Quando a coisa é feia, escura, malcuidada a tendência do grupo é também ser descuidado, desmotivado.

Como nasceu e se desenvolveu o projeto ICESP?

Como esse período na direção da Faculdade rendeu muitos frutos e boa visibilidade, nessa época eu pedi para o Governador Alckmin terminar o prédio do Instituto da Mulher. O prédio quase foi acabado, mas passou para a gestão Serra, ainda sem um projeto definido. O governador Serra perguntou qual era a minha opinião sobre fazer um grande hospital de câncer público em São Paulo, que não existia.

Achei a ideia muito boa e daí nós tocamos o projeto de começar o ICESP. Um hospital que já nasceu paperless (sem papel) e teve a humanização como um dos pilares de treinamento. Ativar 450 leitos de câncer com as dificuldades de recursos financeiros que são crônicos no Estado e com qualidade proposta foi um desafio muito interessante. Acho que foi o desafio mais interessante que tive frente à gestão pública.

Como foi sua experiência como Secretário de Estado da Saúde de São Paulo (2011/2013)?

Um desafio enorme pela principal razão que faltam recursos para a saúde pública, ou seja, sempre se trabalha com uma pressão de demanda, que é superior a sua capacidade de atendimento. Há uma necessidade em ampliar a rede e uma dificuldade em custear a rede atual. Ou seja, você custeia a rede existente com grandes limitações, não podendo fazer os investimentos necessários para mantê-la moderna, ativa e, ao mesmo tempo, existe uma pressão pelo crescimento da rede. Além disso, há uma agenda eleitoral dissociada das questões técnicas.

O grande problema da saúde e da educação é que deveriam ser áreas técnicas, dissociadas de pressões políticas. E tem a questão da judicialização. A interpretação de uma parte do judiciário que todos têm direito a tudo, isso acaba tornando o sistema algo muito difícil de ser administrado.

Recentemente o Instituto de Radiologia - HCFMSUP (INRAD) inaugurou um novo prédio extremamente moderno. Qual a visão de futuro para a instituição?

Tendo eu completado meu segundo mandato como Diretor da Faculdade de Medicina e Presidente do Conselho de Administração do Hospital das Clínicas, eu cheguei à conclusão que a minha história em cargos de relevância havia se encerrado. Eu gostaria de me dedicar a um projeto de projeção para a radiologia, que pudesse ter uma sustentabilidade e não dependesse, exclusivamente, dos recursos públicos e daí isso se associou a concepção de um novo INRAD - na vanguarda da radiologia brasileira com incorporações tecnológicas, como foi o caso da Ressonância 7 Tesla e da aquisição do PET-RM.

Como nasce o Centro de Inovação do INRAD?

Dentro da diretriz de ter um Instituto de Radiologia forte e com maior autonomia financeira, parcerias com a indústria possibilitariam uma organização moderna e competitiva a nível internacional. Isto passa obrigatoriamente pela parceria com a indústria em projetos de inovação. Neste contexto, Jeff Immelt, presidente mundial da GE, que vinha da área de saúde, tinha o desejo de fazer projetos na área no Brasil e daí ele propôs que fizéssemos um projeto no INRAD. Na sequência, foram selecionados dez projetos, recursos foram aportados e,

assim é alavancado o Centro de Inovação do INRAD, dando espaço para modernização, desvinculado da dependência total de recursos públicos para crescer na vanguarda.

Como estimular o empreendedorismo e a inovação nos profissionais de saúde?

Eu sinto que nós temos muitos médicos jovens que têm o desejo de empreender, que tem ideias com a questão de informática, como facilitar o fluxo de informação em saúde, como utilizar as mídias eletrônicas para atingir as pessoas, então hoje existe um perfil do jovem universitário de querer empreender, e ter uma independência maior, é uma nova cultura que tem que ser absorvida e disponibilizar os instrumentos que permitam ela florescer. Tem que criar uma infraestrutura para que os projetos possam vingar.

Como fazer uma boa negociação para a Saúde?

Duas questões centrais: é boa para a ciência? É boa para a sociedade? Toda ideia tem que ter uma base sólida fundamentada em princípios. Se você se norteia por princípios adequados, a chance de dar certo é muito maior. Se estes dois princípios forem atendidos, aí

vale a pena negociar e até ceder em alguns pontos para viabilizar o projeto. Muitos projetos que são propostos não têm nenhum benefício para a ciência e não trarão nenhum projeto para a sociedade.

*Essa entrevista faz parte da edição de setembro da revista Saúde Business, em breve na íntegra no portal. Por enquanto fique atento na cobertura do HIS!!!