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Avaliando as Políticas de Promoção de Atividade Física entre Adolescentes Escolares

Na edição de 16 de janeiro de 2014 deste blog, convidamos a todos a fazer uma avaliação da política de saúde nos últimos quatro anos, tentando seguir os passos das promessas de campanha realizadas pelo presente Governo.

No entanto, ponderamos sobre a dificuldade em realizar esta avaliação, dada a inexistência no Programa do Governo de metas quantitativas e indicadores que pudessem avaliar estas promessas. A solução seria, nesse caso, encontrar alguns indicadores que pudessem avaliar o que aconteceu associado a estas promessas durante o período.

Dos 13 pontos que faziam parte do Programa, o primeiro deles era Promoção da Saúde e Prevenção de Doenças,que incorporava entre várias promessas, a de articular diferentes políticas públicas, educar e mobilizar a sociedade para a vida saudável e implantar políticas públicas para promoção à saúde (incentivo à prática de atividade física e a alimentação saudável) e para redução da exposição a fatores de riscos (controle do uso do álcool, fumo, uso abusivo de medicamentos) e a articulação dessas ações com a atenção básica.

A principal política para educar e mobilizar a sociedade para a vida saudável consistiria em montar um forte sistema de promoção e educação nas escolas, especialmente nas escolas públicas, para a população que entra na adolescência, buscando fazer com que esta população reduza sua exposição aos principais fatores que põe em risco sua saúde. Mudanças de comportamento nesta idade terão reflexo imediato, entre os próprios adolescentes, que se extenderão por toda a vida. Embora educar os pais também seja importante, a principal medida seria a educação de jovens através da Escola, onde os valores vão se refletir em um comportamento mais saudável nas idades posteriores.

Assim, para avaliar o impacto desta promessa de campanha, utilizamos os dados da Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE) do IBGE, dos anos 2009 e 2012. Esta pesquisa, iniciada em 2009, foi primeira iniciativa nacional voltada a pesquisar o comportamento de adolescentes sobre fatores de risco e a proteção à saúde. Constitui um importante instrumento para subsidiar, com informações quantitativas, aos gestores de políticas públicas de saúde nas escolas e para promover avaliações e monitorar a saúde do escolar. De forma mais ampla, permite subsidiar o desenvolvimento de políticas públicas para a proteção e promoção da saúde dos adolescentes[i]. É uma pesquisa por amostragem, realizada entre escolas das redes pública e privada com alunos da 9ª. série do ensino fundamental.

A pesquisa foi elaborada pelo IBGE e pelo Ministério da Saúde e contou com a colaboração do Ministério da Educação, que disponibilizou o cadastro das escolas públicas e privadas em todo o país, o qual foi utilizado para a seleção da amostra. Este Ministério também comunicou à rede de escolar sobre a realização da pesquisa, preparando as escolas para receber os entrevistadores e o material para a coleta de dados.

A pesquisa buscou conhecer os fatores de risco e proteção à saúde dos adolescentes bem como informações básicas que foram fornecidas pelos diretores das escolas selecionadas ou pelos seus responsáveis. A primeira edição da pesquisa, publicada em 2009, contou com uma amostra somente para os municípios das capitais estaduais e para o Distrito Federal. A segunda edição, de 2012, sofreu uma significativa ampliação em sua abrangência geográfica, em relação à edição anterior da pesquisa, englobando dados para o conjunto do País e para as Grandes Regiões do País, além dos 26 Municípios das Capitais e o Distrito Federal que já haviam sido pesquisados em 2009.

Para efeito da análise que vamos realizar, estaremos comparando somente o total de jóvens que frequentam a 9ª. série escolar nos municípios das 26 capitais e do Distrito Federal. Buscaremos avaliar alguns aspectos importantes de promoção de saúde e prevenção de fatores de risco para estes jovens, destacando aqueles mencionados nas promessas de campanha do governo em 2010 e outros mais.

A escolha da 9ª. série do ensino fundamental como universo para a realização da pesquisa não se deu por acaso. Esta é a série mais representantativa das idades que caracterizam a transição da infância para a adolescência. De acordo com o IBGE, “durante a transição da infância para a vida adulta, os adolescentes experimentam mudanças biológica, cognitiva, emocional e social. Esta fase é um importante momento para a adoção de novas práticas, comportamentos e ganho de autonomia para a vida futura, mas ao mesmo tempo, uma fase de maior exposição a diversas situações de risco que podem comprometer o presente e futuro da saúde dos indivíduos. A exposição a fatores de risco comportamentais, como o tabagismo, consumo de álcool, alimentação inadequada e sedentarismo tem, com frequência, início na adolescência. Estes fatores estão associados ao desenvolvimento da maioria das doenças crônicas não transmissíveis, como as cardiovasculares, diabetes e câncer, que lideram as causas de óbito na vida adulta no País e no mundo. É também na adolescência que o início da atividade sexual tem sido mais frequente. Esta é uma questão importante, pois o sexo desprotegido está associado à gravidez na adolescência. A proporção de nascimentos no Brasil cujas mães tinham idade entre 10 e 19 anos, em 2007, segundo do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos do Ministério da Saúde - SINASC, foi de 21,1%. Além disso, a ausência da proteção é fator de risco para doenças sexualmente transmissíveis - DST, como a AIDS[ii].

Os principais hábitos saudáveis e fatores de risco que vamos analisar são: a) prática de atividade física; b) consumo de alimentos saudáveis - frutas; c) uso de tabaco; d) consumo de bebidas alcoólicas; e) o uso de drogas ilícitas; f) o uso de preservativos em relações sexuais e g) o uso de cinto de segurança e direção de veículo automotor. A pesquisa não investiga o tema do uso abusivo de medicamentos entre adolescentes, não permitindo uma análise desta variável.

Na presente edição deste blog, nos limitaremos à análise dos temas associados ao sedentarismo e à atividade física, comparando os dados existentes entre as PeNSE/IBGE 2009 e 2012 e fazendo algumas inferências entre estes dados e aqueles apresentados pela Pesquisa Vigitel, realizada pelo Ministerio da Saúde para a população maior de 18 anos, no mesmo período.

Algumas Características da população estudada

A tabela 1 mostra as características dos jovens que frequentam a 9ª. série escolar do ensino fundamental nas capitais estaduais. Verifica-se que entre 2009 e 2012, pode ter ocorrido um ligeiro aumento da idade média das pessoas que frequentam esta série, diminuindo o número de jovens com 13 anos ou menos de idade e aumentando o número de jovens com 14 ou mais anos de idade.

 Tabela 1

Características dos Jovens que Frequentam a 9ª. série escolar nas Capitais Estaduais Brasileiras: 2009-2012

tabela1

Outros fatores importantes são o aumento da participação masculina, o aumento da participação de pretos e amarelos, e o aumento da participação de alunos em escolas privadas, ainda que pelo menos três quartos dos jovens que frequentavam a 9ª. série do ensino fundamental o faziam em escolas públicas em 2012.

Prática de Atividade Física

A PeNSE do IBGE considerou como nível adequado, a prática de pelo menos 300 minutos de atividade física por semana ou uma hora por dia de atividade física, numa semana escolar de cinco dias, em função de recomendações internacionais.

Como indicado pelo IBGE, “a prática de atividade física pela população tornou-se uma questão de saúde ainda na década de 1990. Muitos estudos enfatizam como sendo importante a construção do hábito da prática de atividade física já na infância. Estimular a prática da atividade física em crianças e adolescentes é importante para uma vida adulta mais ativa. É recomendado que nesta faixa etária haja pelo menos uma hora de atividade física moderada a vigorosa diariamente, ou 300 minutos de atividade física acumulados por semana (CURRIE et al., 2008)[iii]”.

Tabela 2

Porcentagem de Jovens Frequentando a 9ª. série do Ensino Fundamental nas Capitais Estaduais Brasileiras que Praticaram Mais de 300 Minutos de Atividade Física Semanal por Sexo e Tipo de Instituição Escolar: 2009-2012

tabela2

Como pode ser visto na tabela 2, os dados da PeNSE mostram que o percentual de jovens que se enquadravam nos padrões adequados de atividade física se reduziu de 43,1% para 33,0% entre 2009 e 2012, o que equivale a uma redução de 23%.

As reduções se observam em ambos os sexos e tanto nas escolas públicas como privadas, como pode ser observado na tabela 2. Maiores reduções se verificaram para homens, em relação às mulheres e nas escolas públicas em relação às privadas.

Vale destacar, por outro lado, o preocupante aumento da participação de jovens inativos fisicamente, de 4,8% para 5,8% e um aumento na participação de jóvens com menos de 150 minutos de atividade física semanal, como pode ser visto no gráfico 1, o que leva a conclusão de que em média houve uma redução do envolvimento de jovens em atividades físicas regulares semanais.

grafico1

Fonte: IBGE, PeNSE, 2009 e 2012

Uma informação adicional seria comparar o número de aulas de educação física oferecidas aos estudantes de 9ª. série do ensino fundamental, entre 2009 e 2012. A tabela 3 mostra esta informação.

Tabela 3

Porcentagem de Jovens Frequentando a 9ª. série do Ensino Fundamental nas Capitais Estaduais Brasileiras que Tiveram pelo menos Duas Aulas de Educação Física na Semana Anterior à Pesquisa: 2009-2012

tabela3

Verifica-se que entre 2009 e 2012 praticamente não houve nenhuma variação na porcentagem de jovens que tiveram duas ou mais aulas de educação física na semana anterior a da pesquisa. No entanto, houve uma pequena melhora na porcentagem de estudantes que tiveram duas ou mais aulas de educação física nas escolas públicas (ao redor de 4%).

Quando se considera o desempenho específico dos municípios das capitais quanto a variação na porcentagem de alunos que tiveram mais de duas aulas por semana nos municípios das capitais estaduais (tabela 4), pode-se verificar situações bastante díspares. Dos 26 municípios (mais o Distrito Federal) considerados, onze aumentaram a porcentagem entre 2009 e 2012, sendo os que apresentaram melhor desempenho neste indicador foram Teresina, Macapá, Natal, Belo Horizonte e Distrito Federal.

Dois municípios não apresentaram variação e 14 pioraram seu desempenho neste indicador. Os cinco municípios com pior performance foram Rio Branco, Aracajú, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Belém, todos eles apresentando quedas  entre 15% e 34% na porcentagem de jovens frequentando a 9ª. série que tiveram pelo menos duas aulas de educação física na semana anterior a da pesquisa.

Tabela 4

Porcentagem de Jovens Frequentando a 9ª. série do Ensino Fundamental nas Capitais Estaduais Brasileiras que Tiveram pelo menos Duas Aulas de Educação Física na Semana Anterior à Pesquisa por Capital Estadual, ordenadas por Desempenho: 2009-2012

tabela4

Quando se considera o valor deste indicador encontrado para o ano de 2012, verifica-se que existem também grandes discrepâncias quanto a sua cobertura (ver gráfico 2). Municípios das capitais como Vitória, Curitiba, Distrito Federal, Florianópolis, Belo Horizonte, Boa Vista e Palmas tem porcentagens de alunos da 9ª. série com pelo menos duas aulas de educação física por semana superiores a 70%, enquanto que outros como Rio Branco, Belém, Fortaleza, Macapá e Rio de Janeiro tem porcentagens menores do que 25%. Logicamente que estas coberturas poderiam variar quando se considera a cobertura somente de escolas públicas.

grafico2

Fonte: IBGE, PeNSE, 2009 e 2012

Algumas Inferências dos dados da PeNSE em relação aos Dados da Pesquisa Vigitel

Os dados da PeNSE, em certo sentido, contrastam com aqueles publicados na pesquisa do VIGITEL, do Ministério da Saúde. Os dados da VIGITEL indicam que entre 2009 e 2012 o número de pessoas com mais de 18 anos de idade que fazia atividades físicas regulares aumentou de 14,7% para 33,5%[iv]. No entanto, é necessário esclarecer que estas pesquisas apresentam conceitos, universos e características amostrais diferentes, dado que:

  • Os dados da Pesquisa VIGITEL são coletados para a população de 18 anos ou mais anos de idade, enquanto, no universo da população da PeNSE, somente 11% tem mais de 16 anos, e desses é provavel que um conjunto insignificante tenha 18 anos ou mais;

  • Os dados da Pesquisa VIGITEL são coletados por chamada telefônica entre domicilios que tem telefone fixo em casa, os quais correspondem a somente 40,1% dos domicílios do país, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilios do IBGE (PNAD) de 2011. A PeNSE e a pesquisa VIGITEL não estratificam a população de suas amostras por nível de renda. Mas no caso da pesquisa VIGITEL, existe uma grande probabilidade de que exista un viez que sobre-represente a população dos segmentos de classe média e média alta, que são aqueles que tem telefone fixo em casa

  • Os estudos com informações sobre o comportamento de adultos têm demonstrado que a prática da atividade física no lazer é mais frequente entre pessoas de maior renda, ou maior escolaridade[v]. Por esta razão, é provável que a PeNSE estaria refletindo, de forma mais precisa, a realidade dos grupos mais pobres da população do que a pesquisa VIGITEL.

  • A população pesquisada pela VIGITEL tem meios de obter outros tipos de informação sobre fatores de risco à saúde, através de televisão e internet, sua educação e consciência quanto aos fatores de risco estaria determinada por outros condicionantes distintos das ações desempenhadas pelo Ministério da Saúde;

  • A pesquisa VIGITEL considerou  como pessoas que fazem atividade física, aquelas que usam 30 minutos diariamente para estas atividades em cinco dias na semana, o que corresponde ao conceito de 150 minutos por semana como mínimo necessário. Utilizando este conceito para comparar o comportamento das populações da PeNSE e do VIGITEL, verifica-se que os jovens com menos de 18 anos que faziam um mínimo de 150 minutos de atividade física por semana, de acordo com a PeNSE, diminuiram de 69,4% para 59,4% enquanto que, segundo o VIGITEL, as pessoas com 18 anos em mais aumentaram a prática de atividade física de 14,7% para 33,5%, sendo que no grupo de 18 a 24 anos, de 18,4% para 47,6%, no período 2009 e 2012, respectivamente. Este rápido aumento mostra variações difíceis de explicar em tão pouco espaço de tempo, as quais podem estar associadas a problemas metodológicos que dificultariam a comparabilidade das pesquisa VIGITEL de 2009 com a de 2012.

Considerações finais

As tendências na prática de atividades físicas entre adolescentes constituem uma melhor indicação sobre os comportamentos futuros da população do que as tendências da população adulta, na medida em que influenciam fortemente a construção de hábitos permanentes de prática de atividade física ao longo do ciclo de vida.

Nesse sentido, a comparação dos dados da PeNSE de 2009 e de 2012 podem estar indicando falhas na educação dos jovens sobre a necessidade de um maior compromisso com a prática atividade física entre escolares, entre o final do governo passado e o início do novo governo, contrariando as promessas da campanha de 2010 para o mais importante e decisivo grupo de risco.

Provavelmente, as deficientes condições físicas das escolas, a falta de professores para a prática destas atividades e a falta de articulação entre os sistemas educativos e os sistemas de saúde entre os Estados e Municípios podem explicar estes resultados. O cumprimento da promessa de campanha do presente governo exigiria uma maior articulação entre o Ministério da Saúde, as redes estaduais e municipais de saúde e as Secretarias Municipais e Estaduais de Educação. Mais do que vontade política, seriam necessários mais recursos e sinergias para que a promessa pudesse ser transformada em realidade.


 NOTAS

 [i] IBGE (2010 e 2013), Pesquisa Nacional de Saúde Escolar, Ed. IBGE, Rio de Janeiro, 2009 e 2012. Os dados são apresentados com um intervalo de confiança amostral de 95%.

[ii] Ver IBGE (2010), Pesquisa Nacional de Saúde Escolar, Ed. IBGE, Rio de Janeiro, 2010, (Introdução)

[iii] CURRIE, C. et al. (2008), Inequalities in young people’s health: HBSC international report from the 2005/2006 survey. Copenhagen: World Health Organization, 2008. 206 p. (Health policy for children and adolescents, n. 5). Citado por IBGE (2010).

[iv] Ministerio da Saúde, Vigitel Brasil 2009 e 2011,Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico, Brasilia, 2009 e 2011. Os dados também são apresentados com um intervalo de confiança amostral de 95%.

[v] MALTA , D. C. et al (2008). Padrão de atividade física em adultos brasileiros: resultados de um inquérito por entrevistas telefônicas, 2006. Epidemiologia e Serviços de Saúde, Brasília, DF: Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, v. 18, n. 1, p. 7-16, jan./mar. 2009. Disponível em:http://scielo.iec.pa.gov.br/pdf/ess/v18n1/v18n1a02.pdf

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