Anualmente, a Kleiner Perkins Caufield Byers, do famoso investidor John Doer (não é difícil encontrar fotos na internet de John Doer com o Obama, com o Mark Zuckerberg, etc, veja essa foto de um jantar deles em 2011), publica após a Code Conference, um relatório de tendências da Internet e como seus investidores veem oportunidades e ameaças nas principais tendências do setor no mundo.
Resumimos aqui algumas delas e você pode conferir a apresentação completa em inglês ao final do artigo.
Usuários de Internet:
- O crescimento do número de usuários de Internet no mundo tem sido menor que 10% ao ano e diminuindo. O crescimento ainda é maior em países em desenvolvimento e mais difíceis de monetizar como Índia, Indonésia e Nigéria;
Usuários de Smartphone:
- Crescimento anual de 20% ao ano, mas diminuindo, porém ainda forte em países com menos penetração como China, Índia, Brasil e Indonésia;
- Dos 5.2 Bilhões de telefones celulares no mundo, 30% já são smartphones;
Tablets:
- 52% de crescimento ao ano em número de unidades, por ser ainda um mercado em fase inicial;
- Esse crescimento dos tablets é maior do que qualquer taxa de crescimento que os computadores e notebooks jamais tiveram, ou seja, a adoção de tecnologías está cada vez mais rápida;
- A tendência é que o número de tablets continue a crescer muito pois ainda é 10x menor que o número de televisores e celulares;
Tráfego de Dados Mobile:
- 81% de crescimento acelerado, sendo vídeo a principal razão desse crescimento;
- O acesso à Internet por smartphones como % do uso total de internet é de 25% em média no mundo (na Ásia é de 37%, e na África, de 38%), com crescimento médio de 14% ao ano;
- Os sistemas operacionais dominantes mudaram drasticamente de 2005 para 2013. Em 2005, o Nokia Symbian representava quase 70% dos celulares. Hoje esse sistema operacional praticamente inexiste, e o Android representa quase 80% do mercado, com Apple (iOS), com aproximadamente 15-17%. E 97% dos sistemas operacionais dominantes hoje são feitos nos EUA.
Ciclo da Computação
Outro achado interessante da KPCB, de um estudo do Morgan Stanley Mobile Internet Report, mostra que em cada novo ciclo da computação (MainFrame, Minicomputador, PC, Desktop Intenet, Mobile), o número de usuários no estágio de maturidade é 10x maior que o do ciclo anterior, o que questiona se chegaremos em 10 bilhões de smartphones (o dobro do que temos hoje), em breve.
Faturamento das Grandes Empresas de Tecnologia
O faturamento anual por usuário (ARPU – annual revenue per user) do Google é de 6x o ARPU do Facebook, que por sua vez é de 2x o do Twitter. Essas informações podem significar que as empresas mais antigas conseguiram (ou tiveram que) aumentar o faturamento por usuário ao longo do tempo, ou que as novas empresas de tecnologia tem menos faturamento por usuário, o que obrigará as novas empresas a terem cada vez mais usuários para alcançar o mesmo faturamento.
Gastos de marketing em Mídia Digital vs. Mídia Impressa
Aqui é onde nós do EmpreenderSaúde mais confiamos que os concorrentes estão comendo bola, em bom português. O tempo total gasto com mídia impressa hoje é de 5%, enquanto que o orçamento de marketing total gasto com mídia impressa é de 19% (“way over-indexed”, de acordo com Mary Meeker, autora da apresentação).
Enquanto, isso o mercado de mídia digital internet e mobile em relação ao mercado atual tem espaço para crescer em US$ 30 bilhões nos EUA.
Faturamento com Mobile
O faturamento com aplicativos ainda é 68% do total do faturamento com aplicativos, enquanto o faturamento com propaganda mobile toma o restante de 32%.
Antes da saúde, outras observações
O estudo também mostrou que o número de ataques hackers de segurança estão aumentando e se tornando mais sérios, e atingindo também mobile. KPCB mostrou que um sistema vulnerável colocado na internet fica comprometido em menos de 15 minutos, e que 95% das redes tem a segurança comprometida de alguma forma.
Mary mostrou ainda que não acredita que o valuation das empresas de tech seja uma bolha nos EUA, comparando com os número das bolhas da pontocom em 2000. Mostrou também que educação pode estar chegando em um ponto de inflexão, com sites de educação como Duolingo e Coursera tendo hoje 25 e 7 milhões de usuarios, respectivamente, e canais como o Khan Academy tendo mais de 430 milhões de views no Youtube, com 69% de crescimento ao ano.
Por fim (?), a saúde nos EUA
O custo total da saúde nos EUA foi de 2.8 trilhões de dólares em 2012, representando 17% do PIB americano, e crescendo o dobro do crescimento do PIB em média nos últimos 35 anos.
Ao mesmo tempo, é estimado que 27% desse custo seja desperdício, US$ 210 bilhões em serviços desnecessários, US$ 190 bilhões em custos administrativos desnecessários, US$ 55 bilhões em oportunidades de prevenção perdidas, US$ 310 bilhões em fraudes, serviços de saúde ineficientes e preços inflados.
De acordo com o estudo, os empregadores carregam a principal carga desse custo, sendo que os empregadores gastarão US$ 620 bilhões em 2014 com seus empregados, um aumento de 28% em 5 anos. Por isso, 67% dos CFOs veem a saúde como um preocupação crescente na empresa.
Crescimento dos custos individuais de saúde e Doentes Crônicos
Em 2015, aproximadamente 25% da renda familiar irá para a saúde, enquanto essa taxa era de 18% em 2005. Enquanto que 5% dos doentes (a maioria com múltiplas doenças crônicas) são responsáveis por 50% desses custos (dados de 2009). Sendo que metade das falências familiares nos EUA é devido à gastos em saúde.
As doenças crônicas são responsáveis por 75% dos custos, e entre as mais caras estão câncer, diabetes, doenças cardiovasculares, hipertensão e infarto (todas fortemente ligadas à estilo de vida). 1 em cada 2 americanos tem pelo menos 1 doença crônica, enquanto 1 em cada 4 tem duas ou mais, com 32% de obesidade (a taxa era de 15% em 1990).
A questão do comportamento/estilo de vida é uma discussão que tem que ser feita para lidar com esses problemas. Por exemplo, 52% dos adultos não cumprem as recomendações mínimas de atividade física (2011), enquanto 50% dos doentes crônicos não são aderentes aos seus tratamentos, levando à US$ 100 bilhões de dólares em custos por internações que poderiam ter sido evitadas (2010).
Mary Meeker considerou que tais problemas na verdade são uma oportunidade para o setor, que se apoiou em tecnologias antiquadas, e novos sistemas e soluções tem enorme problemas para resolver, o que significa muitos ganhos possíveis. Ao mesmo tempo, os governos tem se tornado grandes fomentadores (principalmente nos EUA) de adoção de soluções de TI em saúde. De olho nisso, o investimento de venture capital em saúde digital cresce 39% ao ano, tendo sido de US$ 1.9 Bilhão em 2013.
O estudo da Kleiner Perkins também falou da “consumerização da saúde”, em que 52% dos consumidores hoje querem ferramentas de acesso ao sistema, sites com rankings de qualidade e satisfação de médicos e hospitais. O novo usuário também quer se comunicar com o médico por email (62%).
Tais incentivos tem funcionado, resultando hoje em 84% dos hospitais e instituições acadêmicas com prontuários eletrônicos hoje nos EUA, e 51% para consultórios e clínicas.
Qualidade sobre Volume
As operadoras e outros pagadores tem sido cada vez mais incentivados a engajar os pacientes para melhorar cuidados e resultados e reduzir custos, saindo do fee-for-service para um pagamento pensando em valor agregado para o paciente. A expectativa é que 60% dos pagadores vão oferecer programas de preços transparentes para os usuários que possam escolher emagrecer ou reduzir o colesterol, por exemplo, para pagar menos pelo convênio.
O estudo deu exemplo do RedBrick Health, uma plataforma de engajamento de funcionários que provou que para cada dólar gasto com a plataforma 4 dólares são economizados com saúde. A Teladoc, um programa de teleconsulta vendida para o empregador, mostrou economia de US$ 798 dólares por consulta, por economizar na consulta presencial e por economizar numa visita ao prontosocorro nos próximos 30 dias, caso não houvesse a consulta.
A MangoHealth, um aplicativo de aderência à medicamento, mostrou 84% de aderência ao uso de estatina em relação à 52%, que é a média sem o aplicativo.
A WellDoc, uma plataforma de doenças crônicas com prescrição para diabetes, conseguiu reembolso do convênio pelo serviço, mostrando que é possível o pagamento de soluções digitais por convênios.
Outros Mercados para olhar (e o que eles significam para saúde?)
Outro mercado observado pela Kleiner Perkins é o mercado de aplicativos de mensagens instantâneas (WhatsApp, WeChat, Viber, SnapChat etc), que alcançaram juntos mais de 1 bilhão de usuários em 5 anos.
A interessante observação sobre o mercado foi a comparação com o Facebook. Enquanto o Facebook funciona em geral com poucas mensagens para grandes audiências (o “status” e a timeline), esses aplicativos como WhatsApp funcionam com mensagens frequentes para um menor número de usuários. Alguém já pensou que em vez de fazer uma grande rede social de doentes crônicos, talvez pequenos grupos de contato mais frequente seja uma melhor solução?
O estudo também mostrou o crescimento de redes sociais baseadas em compartilhamento de imagens e vídeos como Tumblr, Pinterest, Instagram, Vine e SnapChat.
O estudo também mostrou que no início da era dos aplicativos, a tendência era de aplicativos multi-funções, e hoje a tendência é de aplicativos com uma única função (“there’s an app for that”).
Outro sinal da evolução dos apps é o crescimento dos “apps invisíveis”, aqueles que você quase nunca abre, só quando eles tem algo a dizer a você, pois são desenhados exatamente com esse propósito.
Quais Mídias Sociais valem a pena?
O super estudo da Kleiner Perkins também mostrou que os líderes de Traffic Referral (ou seja, quais redes socias trazem mais tráfegos para os sites) são Facebook (com 21% do tráfego em média), Pinterest (com 7%), e Twitter (com 1%). Mostrou ainda que um artigo em média alcança metade dos seu tráfego total de referrals após 6.5 horas no Twitter e 9 horas no Facebook.
Conteúdo – Mais importante do que nunca
Se você acompanha o EmpreenderSaúde, deve ver nossa quase semanal defesa por conteúdo de qualidade como uma das mais poderosas novas armas da saúde e do marketing. O KCPB, que também percebeu isso, trouxe o case do BuzzFeed como exemplo. O BuzzFeed cresceu sua audiencia em 3x no último ano, crescendo 50% em consumo mobile, 75% nas redes sociais, e mais de 50% entre as idades de 18-34 anos.
Os principais tipos de conteúdos foram Listas, Quizzes, Explainers, Breaking News, Videos e Mobile.
A apresentação da Kleiner Perkins chamado Internet Trends 2014, tem 164 slides, e estamos apenas no slide 45. Apesar de valer a pena cada slide, preferi resumir as principais tendências e questionar como elas podem impactar a saúde, principalmente com a tendência de “consumerização da saúde”.
Reinventando
Reinventando como as pessoas se conhecem, o aplicativo Tinder, que faz match de perfis para namoro, fez 11 milhões de “encontros” em 2014, um crescimento de 14 vezes no último ano. O estudo mostrou também que na área de supermercados e mercados locais, a entrega no mesmo dia é o “the next big thing”, tomando o exemplo do Amazon Fresh. Como podemos fazer o match das necessidades do pacientes com os médicos que melhor podem atendê-las (por doença ou especialidade médica), e fazer a “entrega”/atendimento no mesmo dia em vez de a ANS ter que exigir dos convênios um período máximo de espera de dias pela marcação de uma consulta?
O estudo mostrou ainda a queda das vendas de músicas digitais (caiu 6% no último ano, enquanto streaming cresceu 32%), mostrando a tendência do consumidor de valorizar mais o “usar”/experiência do que o “ter”, criando novos modelos de negócio (seria a mesma tendência que estaría empurrando o sistema de convênios para clínicas mais baratas? Ou seja, para que ter um convênio se finalmente eu posso pagar um preço aceitável pelo cuidado da saúde quando realmente precisar em vez de pagar por algo que posso demorar meses ou anos para usar?).
A apresentação da Kleiner Perkins incluiu ainda o mercado de moedas digitais, mais conhecidos como BitCoins, mostrando que o número de contas de BitCoins já é de 5 milhões, com liderança das plataformas Blockchain e Multibit, seguidas pela Coinbase e em seguida pelo Android Bitcoin Wallet. Além dos pagamentos, isso mostra a valorização da integração e da mobilidade. Quantos convênios o seu consultório/clínica aceita? Aceita BitCoin? As informações do pacientes estão integradas e podem ser transportadas?
“The Internet Trifecta”
Mary Meeker inseriu em sua apresentação ainda a tríade-chave para um negócio de sucesso com conteúdo:
- Conteúdo: Provido por Usuários e Especialistas
- Comunidade: Contexto e Conectividade criada por e para os usuarios
- Comércio: Produtos tageados e comprados quase sem perceber
Big Data é o Futuro, mas o qual o futuro do Big Data?
Os dados são produzidos pelas pessoas, e pessoas com sensores em dispositivos móveis produzem mais dados que quase qualquer coisa.O compartilhamento instântaneo de dados e a comunicação entre devices (Internet of Things) traz mais transparência e tem o potencial de tornar o mundo um local melhor e mais seguro, ao mesmo tempo que vai desafiar a privacidade.
Padrões podem ajudar a lidar com os crescentes volumes de dados e ajudar a resolver problemas previamente insolúveis, mas cria novos problemas relacionados aos direitos dos indivíduos.
O estudo da KPCB mostrou que as tendências em big data serão:
- Dados em tempo reais que possam ser facilmente encontráveis, compartilháveis, e que permitam ao usuário fazer upload dos dados para nuvem mais facilmente;
- Crescimento rápido do uso de sensores (o Iphone 1 de 2007 tinha 3 sensores, o 5s tem 5 sensores, o Galaxy S de 2010 nasceu com 3 sensores, enquanto o Galaxy S5 tem 10 sensores);
- Custo de processamento de dados caindo rápido, enquanto a nuvem vira a regra do setor;
- Novas belas interfaces, criadas a partir de dados gerados pelo usuarios, fazendo com que os dados sejam mais úteis a cada dia;
- Melhoria dos processos de mineração dos dados (data mining), e ferramentas analíticas que ajudem a encontrar padrões;
- Urgência recente por soluções que resolvam os problemas com baseadas em dados e padrões;
Novamente falando de conteúdo, o estudo da Kleiner Perkins envolveu o uso de multi-telas pelo usuários, mostrando que quase metade dos usuários surfa na internet no celular enquanto assiste TV e 66% utiliza Tablet enquanto assiste o TV, também para comprar na internet, ver resultados de jogos, procurar sobre atores e atrizes, mandar emails ou SMS para os amigos sobre o programa que está assistindo na TV etc.
O estudo mostrou também que quanto maior o número de telas possíveis para o consumidor interagir, maior o engajamento e tempo gasto com a marca, consumindo mais conteúdo em menos tempo.
Mostrou também o crescimento das Smart TVs em relação às TVs tradicionais, com aplicativos dedicados (como da ESPN, da BBC e da HBO) substituindo os canais de TV tradicionais, e com o slogan “Consumers Love Video”, mostrou o crescimento explosivo de número de usuários nos canais do YouTube (todos cresceram mais de 100% por ano em número de usuários, e alguns 200 ou 300% ao ano). A duração média dos 10 vídeos com maior sucesso no Youtube é de 7 minutos.
Mostrou que a relação Google-YouTube (o YouTube foi comprado pelo Google há vários anos atrás), permitiu que videos de propaganda seja colocados estrategicamente antes dos vídeos do Youtube com conteúdo que tem relação com os interesses do usuário.
O conteúdo dos vídeos também mudou de comerciais que o usuário que pular para vídeos curtos que os usuarios de fato querem assistir. Para os anunciantes, há um ganho significativo no uso do capital empregado pois o anunciante só paga pelos usuários que de fato querem ver os vídeos. O YouTube tem utilizado os dados produzidos por isso para melhorar o engajamento com o usuário e o retorno (ROI) do anunciante.
Perto do final da apresentação (slide 128), Mary Meeker mostrou o crescimento épico da China, que continua a se tornar cada vez mais relevante como economia.
O estudo mostrou ainda que na China o número de usuários de Internet em smartphones já é de 500 milhões de usuários, com a população total na internet já maior de 600 milhões de usuários (três vezes a população brasileira).
Sobre a China, Mary mostrou que em janeiro de 2013, 9 em 10 das maiores empresas de tecnologia do mundo eram americanas (a única não-americana era Chinesa, a Tencent, criadora do WeChat). Em maio de 2014, esse número havia caído para 6 das 10 (as 4 empresas não-americanas eram Chinesas: Alibaba, Baidu, Tencent e Sohu).
Muitas horas para torturar os slides da Kleiner Perkins e fazer ele confessar o que eu precisava. Vale a pena a reflexão profunda de cada slide e a inter-relação entre eles, bem como de que maneira eles impactam a realidade (presente) e o futuro do seu negócio.
Clique aqui para ver o estudo da Kleiner Perkins, “Internet Trends”