Para o bem do movimento, evitemos a imbecilização das recomendações e das práticas. O ato ou efeito de idiotizar ou imbecilizar aspectos importantes da segurança do paciente tem sido mais contraproducente que a própria histórica inércia ao lidarmos com as reconhecidas falhas e erros assistenciais.
Porque desejo salientar uma grande mensagem, buscarei ser conciso e contundente, usarei de um único exemplo: a meta internacional de segurança #1 – identificação do paciente.
Tenho o privilégio de visitar muitos hospitais e não canso de ver o mau uso desta importante abordagem de segurança. Em um deles presenciei técnico de enfermagem brincando com um colega: - “Seu Renato (nome fictício) internou de novo, deve ser a décima vez este ano. Mas já chequei a pulseira de identificação e seu Renato é mesmo o seu Renato. Incrível, né? Não mudou! ?”.
Lhe é solicitado ainda que registre em prontuário algo como “avaliada a pulseira, identificado o paciente”. Tudo isto deve ainda ser avaliado no contexto do trabalho diário destes profissionais – onde há excesso de trabalho, de pacientes, de redundâncias, de cobranças, até de reclamações – e, quando chega a Acreditação, o excesso virá nevasca (leitura complementar sobre tempestade de iniciativas aqui).
O maior culpado é a ainda comum falta de preparo de nossas lideranças em segurança do paciente. Certo que é tudo muito novo. Eu próprio, há menos de 15 anos, devia achar que análise de causa raiz era alguma disciplina de curso de botânica ou biologia. Mas precisamos urgentemente fazer da segurança dos pacientes uma prioridade nas organizações, profissionalizar a gestão, e capacitar os profissionais nos diversos níveis.
É claro que, para muitas pessoas, em diferentes situações, será necessário confirmar quem é o paciente em sua frente. Mas no dia-a-dia de um enfermaria, a importância do uso da pulseira de identificação é muito mais para outras coisas, como identificar se aquele medicamento endovenoso em mãos, pronto para administração, é mesmo para o paciente que tão bem conheces e sabes o nome, comparando os dados completos da etiqueta do medicamento com os dados completos do paciente, já que nada impede que o medicamento (ou o sangue, ou a dieta enteral) seja para outro paciente de mesmo primeiro nome. Estaríamos identificando o binômio medicamento-paciente, e não somente o paciente.
O HCPA trabalha muito bem estas questões e aqui ressalta os momentos obrigatórios de conferência da pulseira:
[youtube] https://www.youtube.com/watch?v=iGphrsq639g&feature=youtu.be&t=1m13s [/youtube]
Uma orientação inadequada, banalizando a prática, faz com que profissionais da ponta não valorizem iniciativas de segurança – não somente a importância da pulseira e da correta identificação, mas passem a desconfiar das outras orientações também. Quando determinada prática já é motivo de piada nos corredores, não somente pelos profissionais boicotadores ou constipadores, é porque o trabalho em prol daquele nobre objetivo já é desserviço institucional.
As coisas, como premissa básica, precisam fazer sentido para quem na ponta executa. Ou que o processo seja todo automatizado!