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As perspectivas e os desafios para as healthtechs em 2024

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Inteligência Artificial, combate às fraudes, e eCare continuam sendo as áreas de maior investimento

Diante dos desafios da saúde, as healthtechs vêm amadurecendo e consolidando uma cultura de inovação no setor. E a cada avanço tecnológico ou de alguma medida regulatória, abre-se oportunidades para se ampliar portfólio de produtos e serviços, e ter novos entrantes.

O boom da Inteligência Artificial é um desses casos. Segundo especialistas do setor, embora já existam muitas startups no mercado da saúde, o boom de inteligência artificial promete ajudar a área a se desenvolver ainda mais, principalmente no combate às fraudes, que é onde está uma das grandes oportunidades de redução de custos.

“Temos observado um movimento, tanto internacional quanto nacional, de empresas que utilizam inteligência artificial para diagnósticos e pesquisa de novos medicamentos. Essas empresas, que aplicam tecnologias avançadas, parecem estar conquistando cada vez mais espaço no universo da saúde”, diz Eduardo Fuentes, líder de Pesquisa da plataforma Distrito. Segundo ele, atualmente existem mais de 1.200 empresas de tecnologia brasileiras focadas em saúde em operação. “Em 2023, até novembro, essas companhias receberam US$ 131 milhões de investimentos.”

Lilian Natalie Barreiro Natal, diretora de Marketing da Bossa Invest, diz que dados de plataformas como Sling Hub e Distrito apontam que Healthtech foi uma das três verticais que mais cresceram em número de startups no Brasil nos últimos anos. “A área foi ainda mais acelerada pela pandemia, que trouxe maior necessidade de digitalização, escalabilidade, velocidade nos diagnósticos, além de mudanças regulatórias muito necessárias para dar mais rapidez à inovação nesse setor.”

Ela destaca que, com isso, segmentos como telessaúde, por exemplo, deram um grande salto, mas também estiveram (e devem continuar) em pleno curso soluções para saúde mental; medicina preventiva; bem-estar físico (exercícios) dentro e fora de casa; gestão médica; prescrições médicas digitais; dispositivos (wearebles), como relógios medidores de pressão e outros indicadores de bem-estar; análise de DNA; entre outros.

“Temos grupos de coinvestimento voltados exclusivamente para esse setor. Atualmente, temos 13 startups de saúde ativas no portfólio de investidas – como Carefy, Radarfit, Medictalks, PróBrain, Nina Saúde, CloseCare, Medipreço. Mas já temos um montante captado para investir em pelo menos mais três ou quatro startups dessa vertical em 2024”, destaca ela.

Desafios para as startups em 2024

Lilian vê a tendência de um setor bastante aquecido em 2024. “Olhando para as tendências do mercado de venture capital, dados apontam que saúde continuará sendo um dos segmentos de maior destaque neste próximo ano, pois são diversos os problemas a serem endereçados ainda nessa área.”

“No Brasil, a principal área de atuação dessas empresas ainda está relacionada à gestão e desenvolvimento de prontuário eletrônico. Mas a expansão tecnológica pode colaborar para o aprimoramento da cadeia de serviços em saúde, sendo uma ferramenta para a educação em autocuidados, orientação e prevenção para a população, o chamado eCare”, aponta Paulo Rebello, diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

No entanto, ainda há desafios. Entre eles, Lilian destaca o volume de regulamentações, integração e transmissão de dados; padrões de segurança e Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD); infraestrutura digital e acesso à internet (principalmente em locais menos favorecidos); custo para maior democratização dos serviços de saúde – como no caso dos convênios médicos; e saúde e acesso para a terceira idade.

“Trabalhar no mercado da saúde, por se tratar de um setor que lida diretamente com o cuidado das pessoas, demanda atenção e certificações. Isso, por vezes, acaba exigindo recursos, tempo e dinheiro por parte de empreendedores e empresas, o que por vezes dificulta o desenvolvimento de novas tecnologias. Além dessa questão setorial, o cenário macroeconômico brasileiro, com altas taxas de juros e incertezas fiscais, ainda afasta os investidores de risco do mercado, o que pode impactar o financiamento desses projetos”, analisa Fuentes.

Hubs de inovação contribuem para o crescimento do setor de saúde

Parcerias estratégicas também são uma tendência para o setor de saúde que vem se consolidando ao longo dos últimos anos com a criação dos chamados hubs de inovação, nos quais startups podem colocar em prática as suas ideias inovadoras em um espaço de troca e aprendizado e fomento da cultura do empreendedorismo. Para as empresas e os investidores que atuam nesse setor, é uma oportunidade de se posicionarem no ecossistema e de ficar por dentro das novas oportunidades de negócio, seja para fazer investimentos ou parcerias.

“Os hubs de inovação desempenham um papel fundamental no desenvolvimento dos negócios e de novas tecnologias. Ao aproximar empresas de tecnologia entre si e de outras organizações, a troca de conhecimento e oportunidades de negócios é impulsionada, contribuindo assim para o amadurecimento do mercado”, opina Fuentes.

Para Istvan Camargo, head do Skyhub, hub de inovação do Grupo Sabin, os hubs podem contribuir atuando como um ponto de contato ativo entre os negócios das grandes empresas e as propostas de valor desenvolvidas pelas startups.

Ele comenta que o Skyhub investe em startups israelenses e brasileiras, através de recursos próprios, e também pelo Fundo Kortex, criado em sociedade com o Grupo Fleury.  Já na frente de open innovation, o hub desempenha um trabalho ininterrupto de scouting (identificação e avaliação de startups promissoras) para a geração de conexões com as diversas unidades de negócio da empresa, apoiando as áreas internas no design de provas de conceito, criação em conjunto de soluções e ajudando as equipes das startups durante seu onboarding  e na tentativa de escalar suas soluções.

Outra empresa que tem apostado nos hubs de inovação é a farmacêutica AstraZeneca. Olavo Corrêa, diretor geral da AstraZeneca Brasil, diz que o hub deve trazer mais economia e eficiência à saúde. “Para o paciente, as inovações que as empresas podem trazer têm o poder de propiciar maior autonomia no gerenciamento da sua saúde, no acesso à informação e a testes de triagem para a prevenção de doenças. Por meio do cruzamento de dados, podem assegurar um diagnóstico mais rápido e preciso, principalmente em áreas desafiadoras da medicina, como oncologia e doenças raras, além da intervenção multiprofissional em doenças cardiometabólicas e suas complicações, resultando na transformação das jornadas de saúde e melhorias em qualidade de vida.”

Cenário atual da inovação em saúde

Camargo, em uma análise do cenário atual da inovação em saúde, diz que, ano após ano, tem sido possível acompanhar a prática da inovação evoluir e se consolidar ainda mais no setor e que o momento é bastante positivo. “Temos no horizonte diversas oportunidades para quem quer gerar valor por meio da inovação que vão desde melhorias na jornada do paciente até ganhos em eficiência operacional, passando pelo desenvolvimento de novas ferramentas diagnósticas e tratamentos. O mercado está cheio de soluções inovadoras sendo desenvolvidas tanto por grandes empresas quanto por startups.

Já na opinião de Marco Bego, diretor executivo do InovaHC, núcleo de inovação e tecnologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), a inovação da saúde está em um momento de busca por mais qualidade e eficiência nos projetos de inovação, pois com o fim da pandemia os investimentos ficaram mais seletivos e criteriosos.

“Existem muitas oportunidades para solucionar problemas do setor e também propostas que aumentem o acesso, a qualidade dos serviços de saúde e que tragam mais sustentabilidade. Há ainda oportunidades em áreas específicas, como conectividade, interoperabilidade e projetos estruturantes em plataformas de cuidado. Mas é importante que os empreendedores tenham em mente que as suas propostas devem ter mais qualidade e sempre embasamento científico”, ressalta Bego.

Côrrea diz que acredita que a inovação em saúde pode alcançar seu maior potencial por meio da colaboração entre parceiros estratégicos, visando a construção de sistemas de saúde mais sustentáveis e resilientes.

“Cada vez mais, temos visto parcerias entre empresas, startups e demais instituições que fazem parte desse ecossistema, impulsionadas pela transformação digital e novas tecnologias.  Na AstraZeneca, neste ano de 2023 lançamos o Hub Brasil IPE, iniciativa que visa melhorar o acesso dos pacientes a soluções em saúde, desenvolvendo projetos em diagnóstico precoce, conscientização sobre doenças, geração de dados e interconexão de registros médicos eletrônicos no ecossistema de saúde brasileiro. O hub está alocado dentro do campus do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT).”

O Hub Brasil IPE é parte da A.Catalyst Network, rede global de hubs de inovação da empresa que busca parcerias entre múltiplos stakeholders e cujos projetos já impactaram mais 3,3 milhões de pacientes.

Maturidade digital

“Dados do Digital Excellence Framework, índice elaborado pela L.E.K Consulting a partir de uma autoavaliação realizada com 200 empresas de saúde em 19 países, mostram que a maturidade digital da saúde no Brasil ainda está em estágio inicial, com diferentes níveis entre setores e subsetores”, comenta Côrrea.

No entanto, Camargo lembra que ainda existem dificuldades de acesso a serviços de saúde de qualidade por parte da população e esse fator potencializa o crescimento dos negócios na área para os próximos anos.

Côrrea conta que uma das metas da AstraZeneca é se tornar um agente catalisador da transformação digital da saúde e trabalhar cada vez mais em colaboração com todo o ecossistema. “O lançamento do Hub Brasil IPE consolida o novo momento da empresa em inovação, investindo em ações com alta maturidade digital, com estratégias e indicadores claros para alavancar a inovação do ecossistema de saúde brasileiro.”

Para Bego, o momento é bastante positivo, pois existem algumas tecnologias que são habilitadoras de novos produtos, serviços e, principalmente, de novos modelos de negócio na saúde, tais como: 5G, IA generativa, interoperabilidade de dados, entre outras, que podem trazer muitas oportunidades. “O setor tem amadurecido e entra em uma fase de busca por mais qualidade e objetividade nas propostas com validação tecnológica e embasamento científico.”

Hubs de inovações e seus desafios

Mas diante de tantas oportunidades, sempre existem desafios. E eles são de diversas naturezas. “Dentre outros temas, discute-se bastante sobre a falta de interoperabilidade de dados e o desalinhamento de incentivos entre os participantes do sistema. Além disso, temos um aumento na expectativa de vida da população, o que deve aumentar a quantidade de pessoas com doenças crônicas nos próximos anos, além da necessidade de prevenção e qualidade de vida para essas pessoas”, enumera Camargo.

Aliados a esses, há ainda a necessidade de financiamento para projetos inovadores e prototipação; de políticas governamentais para inovação no setor, com ambientes de testes; necessidade de criação de um moonshot – um dos mindsets utilizados no ambiente corporativo para o desenvolvimento de projetos inovadores.

“Precisamos de uma integração entre as três hélices da inovação, que são a universidade, o governo e empresas, buscando fortalecer estruturas que poderiam ajudar os empreendedores a iniciar e validar os seus projetos. No In.Lab, o centro de pesquisa, desenvolvimento e inovação em inteligência artificial aplicada à saúde do Instituto de Radiologia do HCFMUSP (InRad), seguimos esse sistema, pois acreditamos que a ciência acadêmica, em parceria com empresas e governo, pode contribuir significativa e decisivamente para o desenvolvimento socioeconômico do país”, comenta Bego.

Por fomentarem a inovação, Bego acredita que o futuro está na união dos hubs para que seja criada uma estrutura de utilidades para que os empreendedores tenham apoio para diminuir os custos dos projetos, evitar erros que invalidem as ideias ou que não estejam adequados às regulações e legislações do setor, mas, principalmente, que ajudem os empreendedores a aumentar a qualidade e a efetividade dos projetos. 

“Os hubs são parte importante do ecossistema e poderiam ser uma rede de cooperação para fomentar a inovação na saúde. Como exemplo prático do que estou dizendo, posso citar o consórcio que hoje temos com o Hospital das Clínicas, com o Hospital Alemão Oswaldo Cruz e com o Insper. Esperamos que em 2024 tenhamos um grande número de hospitais, universidades e empresas trabalhando juntos para a inovação na saúde”, conclui Bego.

Texto e reportagem: Cristina Balerini
Edição: Ana Souza