Em janeiro, um dos mais respeitados e conceituados infectologistas do País, Marcos Boulos, concedeu uma entrevista ao programa Espaço Público, na TV Brasil, e fez uma afirmação contundente. Ele acredita que o país vive atualmente a maior epidemia já registrada no mundo pelo zika vírus. Em fevereiro, o Ministério da Saúde divulgou um novo balanço, informando que 5.079 casos suspeitos de microcefalia relacionado ao vírus foram registrados em recém-nascidos entre 22 de outubro de 2015 e 2 de fevereiro deste ano.
Essa ocorrência, gravíssima por si só, também preocupa porque, certamente, impactará a Variação de Custos Médicos-Hospitalares (VCHM), a chamada inflação médica. Esse índice calcula a mudança de preços e também o aumento da frequência de uso de serviços, clínicas, laboratórios, hospitais etc. Ou seja, a notícia dos casos do vírus Zika é mais um golpe no já combalido sistema brasileiro de saúde e, a dor, é sempre sentida no bolso.
Além desse fator, há outros dois que são computados para a formação do VCHM. São eles o crescente uso de novas tecnologias e o envelhecimento da população. Em relação ao primeiro, a incorporação de novas tecnologias aos serviços hospitalares ou ambulatoriais pode levar à maior utilização de recursos humanos e de treinamento especializado, que se somam ao maior fornecimento de material e equipamentos. Todas essas variáveis resultam em gastos mais elevados.
Já o envelhecimento da população impacta por razões óbvias: os seres humanos estão vivendo mais e, assim, a probabilidade de terem mais doenças aumenta e, consequentemente, cresce a busca por serviços médicos. Atualmente, 10% da humanidade está na faixa etária acima dos 60 anos.
Em 1980, essa fatia representava 6% do total e a previsão para 2030 é de que esse percentual chegue perto dos 30%. O maior crescimento por faixa etária entre usuários de planos médico-hospitalares está justamente na faixa com mais de 59 anos, com 5,1%. Tal fato retrata a triste realidade brasileira, no que diz respeito à falta de programas de promoção e prevenção de saúde. Estes programas são responsáveis pela drástica redução de custos com saúde nos países mais desenvolvidos.
Já há estimativas apontando que, em 2016, a inflação médica deverá registrar seu recorde histórico, chegando a 20%, de acordo com projeções da Confederação Nacional da Saúde. Em 2015, o índice, ainda a ser confirmado, deverá situar o Brasil como o quarto país com a maior inflação médica entre 29 nações da Europa, Ásia e Américas. Essa é uma conclusão de uma pesquisa internacional da Mercer Marsh Benefícios, consultoria especializada em gestão de benefícios de saúde.
Vale frisar que esse problema não é exclusivo do Brasil. Nos Estados Unidos, o índice inflacionário subiu 216% entre 1980 e 2012. Só a despesa per capita subiu 818%. A marcha começou a desacelerar apenas em 2011, quando a taxa de inflação anual foi maior do que a variação dos gastos com saúde em 32 anos.
O crescimento ficou estável em 2013 quando o índice bateu em 3% e ficou mais próximo da inflação, provavelmente pela reforma promovida pelo presidente Obama, que, dentre outras medidas, alterou substancialmente a maneira de pensar em saúde, onde o foco é reduzir custos e aumentar a qualidade.
Infelizmente, no Brasil, ainda não temos previsão de melhora. Por um lado, os pacientes queixam-se da demora no atendimento médico e dos preços de convênios. De outro, a classe médica e os hospitais ressentem-se do baixo pagamento pelos serviços prestados. No meio disso tudo, o governo patina na má gestão. Ou seja, nada caminha na direção de uma solução comum para todos esses problemas.
Esses vetores contaminam todo o modelo atual de prestação de serviços de saúde e deixam evidente a necessidade de revisão, principalmente no que tange à legislação e à utilização consciente do sistema de saúde. A falta de solução para o conflito torna-se ainda mais prejudicial porque a ausência de serviços públicos eficientes sobrecarrega os planos de saúde. Estes, por sua vez, convivem com prejuízos e com o malabarismo que devem fazer diante do repasse da alta dos custos. Soluções para esses problemas podem passar pela modificação do modelo de remuneração dos prestadores de serviços e pela criação de novas regras para os planos coparticipativos.